17 de nov. de 2007

É POSSÍVEL SER OBJETIVO?

ABRAHAM SHAPIRO

Cinco homens cegos encontraram um elefante. Um abraçou a pata e disse que era o tronco de uma árvore. Outro pegou a cauda e pensou que fosse uma corda muito resistente. O terceiro, pegou a orelha e tinha certeza de tratar-se de uma lona grossa e flexível. Outro pegou a tromba e decidiu que era uma mangueira de regar jardim. O quinto homem tocou um dos lados do animal e concluiu que era uma parede. Um sábio lhes disse: todos vocês têm razão.


A primeira vez que escutei esta parábola, pensei que a lição contida nela é de que a verdade é relativa. Parecia isso, afinal, trata-se de cinco pessoas diferentes, cada uma tirando uma conclusão distinta sobre a mesma coisa.

Anos mais tarde, me dei conta de que a lição fala exatamente o contrário: a verdade não é relativa, mas objetiva. Existe um elefante. E ele está ali. Esta é a realidade objetiva - e independe do ponto de vista de cada um.

A verdade é complexa, multifacetada e às vezes difícil de ser alcançada. Porém, a verdade não é relativa. Há uma verdade logo ali. Nosso problema inicial é dar-nos conta de qual peça do quebra-cabeças estamos pegando. Seja qual for, esta peça é tão somente uma parte do todo, logo, não é o todo.

Os cinco cegos caíram num erro muito comum: chegar a uma conclusão errônea por falta
de informação. Tendo conhecimento de uma só parte do elefante era muito improvável chegar à conclusão correta.

O que poderiam ter feito? Uma possibilidade seria falar entre si compartilhando a informação que cada um deles tinha. Ao juntar todas as peças, uma imagem mais clara começaria a emergir e algumas conclusões iniciais poderiam ter mudado: “Isto não é o tronco de uma árvore. É definitivamente um animal muito grande”, por exemplo. Com mais e mais informação, a imagem eventualmente ficaria mais clara e precisa, revelando finalmente que se tratava de um elefante.

Para se chegar ao julgamento correto, um juiz tem que obter a imagem mais completa possível da situação a ser julgada. "Ver o elefante" não é fácil. Requer que estejamos abertos e prontos a desafiar nossos axiomas, nossas presunções e crenças.


Pondo à prova nossas presunções

Tomemos o exemplo do cego que equivocadamente pensou estar pegando uma mangueira em lugar da tromba do elefante. Chamemos a ele Sr Silva.

Baseado em sua descoberta, o Sr Silva escreve livros sobre mangueiras, converte-se em um autor famoso, bem-sucedido e convidado freqüente para apresentar suas idéias em programas de televisão. Forma um departamento em uma universidade de prestígio totalmente dedicado à investigação da natureza da “mangueira” e os benefícios proporcionados por ela.

Um dia alguém chega e bate a sua porta:

- “Perdoe-me. Você é o Sr Silva, o célebre autor de ‘Os 7 Grande Segredos de uma Mangueira?’”

- “Sim, sou eu” – responde orgulhosamente o cego.

- “Bem, Sr Silva, tenho comigo uma informação importante. Não sei como dizer, porém, o senhor esteve completamente equivocado todos estes anos. O senhor não pegou uma mangueira. Era apenas a tromba de um elefante!”

Como o Sr Silva reagiria diante desta colocação inesperada e surpreendente?

Certamente ele não diria: “Quer dizer que vivi num erro por tanto tempo? Que bom que você apareceu! Como posso agradecê-lo?”

Todos queremos nos proteger de informações que nos parecem ameaças.O normal seria que o Sr. Silva batesse a porta na cara desse sujeito. É uma reação natural. Nós queremos nos proteger de informações que percebemos como ameaças, especialmente quando sentimos que podem ser verdadeiras e nos contradizem. Elas nos causam uma enorme tensão.

O Sr. Silva instintivamente põe uma barreira defensiva tratando de refutar a verdade que veio ofuscar sua reputação e sua carreira. Isto é natural no ser humano, pois, só os computadores armazenam informações sem emoção. Nosso mundo emocional volátil comumente choca com nosso intelecto racional. Quando nos deparamos com conseqüências que poderão ser potencialmente dolorosas, seja um sentimento ferido ou uma mudança difícil de ser absorvida, o coração luta contra a mente.

Esta reação é chamada dissonância cognitiva e é certamente um dos maiores obstáculos que nos impedem de ver a verdade. Ninguém está imune a ela.


Ninguém está imune à Dissonância Cognitiva

Há muito tempo, a descoberta de que a terra é redonda foi rechaçada pelo muno de então. Foi no século XVII, quando Galileo Galilei apresentou provas incontestáveis utilizando telescópios como instrumentos de sua demonstração. Sem conhecer a lei da gravidade, as pessoas não compreendiam por que não caiam de uma terra com formato de bola e que estava em movimento. Aceitar uma idéia contrária ao pensamento que perdurou durante milênios era instável e assustador.

Além disso, você conhece algum ser humano que goste de admitir que está errado no que quer que seja? Para aquelas pessoas era mais fácil ignorar, negar ou rechaçar os fatos levantados e comprovados por Galilei.


O nosso papel de juízes

A todo momento em que tomamos decisões estamos exercendo o papel de juízes. Somos, por isso, obrigados a revisar constante e incessantemente a existência de “subornos sutis” e “não tão sutis” com o poder de deturpar nossos pensamentos e julgamentos. Eles são um verdadeiro risco para nós próprios e para os que estão à nossa volta.

Ser objetivo é uma grande luta. Como vencer nossa tendência natural em achar que estamos certos? Como nos sobrepormos às influências internas? Estamos perdidos em nossa subjetividade?

No entanto, fomos feitos para nunca perdemos a parte objetiva de nós – e de fato não a perdemos. Inclusive em meio a uma discussão, quando nossas emoções se afloram, sabemos que, se realmente quisermos, poderemos forçar a nós mesmos a ser objetivos e a escutar o outro lado. Podemos até admitir que estamos errados. Apesar da neblina de nossa pessoalidade, podemos ser honestos.

Não é fácil. Porém, quando decidimos que a verdade é nosso principal interesse, temos a motivação de nos elevarmos acima de nossas próprias emoções e de trabalhar fortemente para assegurar que nossa mente esteja à frente, tomando as decisões. Assim, e só assim, será possível vermos o elefante!
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Abraham Shapiro é consultor e coach de líderes. Sua filosofia de trabalho, em uma só palavra, é: simplicidade. Contatos: shapiro@shapiro.com.br ou (43) 8814 1473