10 de fev. de 2011

O PAPEL DO LÍDER NA REINVENÇÃO DE UM MODELO DE NEGÓCIOS

Vijay Govindarajan e Chris Trimble

Um presidente que pensa à frente deve fazer três coisas: administrar o presente, esquecer seletivamente o passado e criar o futuro.

Peguemos alguns dos grandes casos de inovação da última década: Google, Netflix e Skype. Agora, a pergunta: por que o Google não foi criado pela Microsoft? A Netflix pela Blockbuster? O Skype pela AT&T?

Por que empresas estabelecidas têm tanta dificuldade para lançar a próxima grande novidade antes de novas concorrentes? O problema é generalizado e os exemplos, incontáveis. A explicação mais simples é que muitas empresas se concentram demais em executar o modelo de negócios de hoje e esquecem que esse modelo é perecível. Sucesso hoje não é garantia de sucesso amanhã.

Para avaliar a vulnerabilidade de sua empresa, faça o seguinte teste: anote, em fichas de papel, cada uma das iniciativas importantes em curso na organização. Em seguida, crie três “caixas”, cada uma com um rótulo: “Caixa 1: administrar o presente”, “Caixa 2: esquecer seletivamente o passado” e “Caixa 3: criar o futuro”.

Em seguida, passe alguns minutos tentando imaginar seu setor daqui a cinco, dez ou até 20 anos (avance até onde uma projeção for razoável). Considere todas as forças de mudança enfrentadas pelo setor: tecnologia, perfil demográfico do consumidor, regulamentação, globalização e por aí vai. Com essas forças em mente, coloque cada iniciativa da organização na caixa condizente: as destinadas a melhorar o desempenho da empresa hoje na caixa 1; aquelas que visam suspender algo (produtos e serviços de desempenho insatisfatório, políticas e práticas obsoletas, premissas e mentalidades ultrapassadas) na caixa 2; e as que preparam a organização para o longo prazo na caixa 3.

Para aguentar firme, a empresa deve promover o equilíbrio certo das forças da preservação (caixa 1), destruição (caixa 2) e criação (caixa 3). Chegar a esse equilíbrio é a tarefa mais importante do presidente, mas a maioria das empresas favorece esmagadoramente a caixa 1. Forças da preservação reinam supremas. Forças da criação e destruição ficam em segundo plano, em desvantagem e sem sorte.

É verdade que o trabalho de preservação — a execução do atual modelo de negócios no dia a dia — é de vital importância. Um presidente que não acerta na caixa 1 terá um mandato curto. É preciso se concentrar diariamente em atingir a excelência no desempenho e na melhoria contínua, como fazem há anos empresas como Walmart e Southwest Airlines. As melhores empresas na caixa 1 são elegantes e eficientes, como um carro bem projetado. Coordenam um sistema incrivelmente complexo de ações humanas como se fossem engrenagens, pistões, eixos.

Só que o presidente não é responsável apenas pela caixa 1. Também precisa acertar nas caixas 2 e 3. Infelizmente, a maioria ignora a destruição e a criação até que seja tarde demais. Resumindo, cede a uma miríade de pressões de curto prazo: intensa demanda por resultados trimestrais, aversão a risco, desconforto com incerteza, resistência a mudanças, extrapolação linear a partir de experiências passadas e medo de canibalizar negócios estabelecidos. O resultado é que muitas empresas deixam de se transformar.

O erro pode não ser imediatamente aparente, mas cedo ou tarde a maioria dos setores passa por mudanças não lineares que ameaçam empresas estabelecidas. Avanços na engenharia genética, por exemplo, revolucionaram a indústria farmacêutica. Novas preocupações sobre qualidade ambiental impuseram sérias ameaças em setores de uso intensivo de energia. A globalização abriu a Índia e a China, onde rivais desconhecidas estão desafiando empresas estabelecidas com produtos de preço ultrabaixo.

Embora enfrente sem problemas a mudança linear, a maioria das empresas fica desorientada com a mudança não linear. Iniciativas de transformação, quando muito, soam tímidas — como tentar transformar um carro em avião parafusando duas asas nas laterais. Basta ver a má colocação da Sony em aparelhos de música portáteis e leitores de livros eletrônicos ou a luta da Nokia e da Motorola para acompanhar a rápida evolução de smartphones.








Para vencer tanto hoje como amanhã, um presidente deve agir em todas as três caixas simultaneamente. Deve reconhecer que as caixas 2 e 3 não envolvem aquilo que a empresa estará fazendo em 20 anos mais, mas sim os preparativos que precisa fazer hoje. Aqui, é mais fácil falar do que fazer, pois não é só uma questão de equilibrar recursos nas três caixas. O presidente também precisa saber exatamente o que destruir e o que criar.

À primeira vista, o trabalho na caixa 2 é podar operações que estão deixando a desejar ou já não casam com a estratégia. Em certas empresas, é uma prática reiterada. Há décadas, por exemplo, a Corning vem se desfazendo de negócios maduros — como o de utensílios de cozinha e lâmpadas — para se concentrar em oportunidades de alto crescimento. Já quando as japonesas comoditizaram o mercado de memória DRAM — componente essencial do computador —, Andy Grove, cofundador da Intel, focou a empresa em microprocessadores. São movimentos traumáticos, mas sem nenhum mistério conceitual. Essa poda exige apenas o compromisso de executivos fortes na empresa.

Mais difícil é eliminar uma ameaça menos evidente na caixa 2: a memória organizacional. Ao tocar o core business, gerentes vão formando vieses, suposições, modos de pensar. Tudo isso acaba entrincheirado — e se enraíza ainda mais em processos de planejamento, sistemas de avaliação de desempenho, estruturas organizacionais e políticas de recursos humanos. A memória organizacional é particularmente forte em empresas que tendem a promover gente da casa e a ter uma cultura homogênea, fortes mecanismos de socialização e longo histórico de sucesso. Essa memória altamente entranhada pode ser ótima para a preservação (caixa 1), mas se não for suficientemente domada (caixa 2), pode obstruir a criação (caixa 3). É por isso que toda iniciativa da caixa 3 deve começar na caixa 2. Conclusão: para poder criar, é preciso antes esquecer.

Para entender como uma empresa pode administrar com êxito essas três caixas, vejamos o caso da Infosys Technologies Limited, da Índia.


Transformação do modelo de negócios na Infosys

No dia 31 de julho de 2006, o presidente da Infosys, N.R. Narayana Murthy, postou-se diante de milhares de trabalhadores em Mysore, na Índia, e apertou um botão laranja. A meio mundo dali, começava o dia na bolsa eletrônica Nasdaq. Essa abertura do pregão a distância, parte dos festejos do aniversário de 25 anos da Infosys, simbolizava a transformação que vivia a economia global.

Para quem tentava entender o fenômeno do offshoring, a Infosys era o “anexo 1”. Aliás, tinha inspirado Thomas Friedman a escrever O Mundo é Plano. A empresa demonstrara que seu principal serviço, o desenvolvimento de software customizado para empresas, não precisava ser feito nas instalações do cliente. A maior parte do trabalho podia ser realizada a milhares de quilômetros dali, num lugar com fartura de talentos e baixo custo: a Índia. A Infosys batizou sua abordagem de “modelo de fornecimento global”.

A rápida ascensão da Infosys já virou lenda na Índia. Na década de 1980 a empresa não passava de um pequeno grupo de programadores que viajara do sul da Ásia aos Estados Unidos para oferecer seus serviços. No começo da década de 1990, no entanto, a rápida desregulamentação na Índia e a disseminação da internet abriram as portas para o modelo de fornecimento global. Hoje, a Infosys é uma empresa de serviços de TI que fatura US$ 5 bilhões, tem mais de 100 mil funcionários e valor de mercado de quase US$ 40 bilhões.

Na década de 1990, quando a receita crescia rapidamente, a Infosys podia muito bem ter se concentrado na preservação. Mas Murthy estava decidido a desafiar as maiores empresas no setor de serviços de TI, incluindo IBM e Accenture. Ele e o então presidente, Nandan Nilekani, tinham uma hipótese sobre como o setor evoluiria. Os clientes mais exigentes da empresa viviam frustrados por ter de trabalhar simultaneamente com várias prestadoras de serviços, nenhuma plenamente responsável pelo todo. A certa altura, acreditavam Murthy e Nilekani, a clientela acabaria contratando apenas uma empresa para prestar a gama inteira de serviços de TI. A firma hipotética teria uma equipe de consultoria administrativa que redesenharia operações e definiria especificações para novos sistemas de TI. Em seguida, essa mesma firma desenvolveria, testaria, instalaria e manteria o novo hardware e software — e poderia até se responsabilizar pela execução de operações rotineiras de clientes, como processamento de transações.

Isso significava uma transformação radical do setor. Se várias firmas avançassem rumo à prestação de serviços completos, antigas parceiras virariam rivais. O setor só teria espaço para um punhado de empresas muito grandes. A Infosys queria ser uma delas — e usar seu domínio do modelo de fornecimento global para superar as rivais. Para tanto, seria preciso criar muitos outros serviços — e, ao mesmo tempo, tocar os negócios que já tinha, em rápido crescimento. Ao agir nas caixas 2 e 3, a Infosys cresceu 25 vezes, de US$ 200 milhões para US$ 5 bilhões na última década. A receita de serviços que não o original — o desenvolvimento de software customizado — cresceu de uma pequena base na década de 1990 para 40% em 2003 e cerca de 60% em 2010.

A Infosys conseguiu evitar uma cilada da caixa 2, a da memória organizacional. Ao armar um universo paralelo (uma “caixa 2/3”) com gente e processos distintos, conseguiu criar o futuro e manter a excelência na caixa 1. No processo, a Infosys deu especial atenção a três áreas críticas: elaboração da estratégia, accountability e desenho organizacional.


Elaboração da estratégia

Os pilares da elaboração da estratégia são bem conhecidos. Deve ser um processo analítico, fundado em dados, que identifique rigorosamente as necessidades do cliente, diferencie a empresa de rivais e maximize lucros. Mas, apesar de seus muitos méritos, esse processo inibe sistematicamente a atividade na caixa 3. Líderes que insistem em dados rigorosamente analisados em geral evitam promover mudanças com base em evidências limitadas ou sinais fracos. O resultado: uma mentalidade de curto prazo; um foco estrito em clientes atuais, não em novos; uma obsessão com as rivais de hoje, e não potenciais concorrentes; uma ênfase no uso de competências existentes, em vez da aquisição de novas; e a tácita premissa de que linhas de demarcação entre mercados são fixas.

Formular a estratégia na caixa 3 é bem diferente. Todo esforço de criação deve começar com uma ação destruidora (caixa 2) — abandonar práticas tradicionais de estratégia em favor de novas. Na caixa 3, a estratégia não vem da extrapolação linear do passado, mas da tentativa de prever mudanças não lineares. É um conceito difícil — porém necessário — de assimilar para um alto líder que chegou ao topo da organização graças à excelência na caixa 1.

Astuta, a Infosys incluiu vozes pouco tradicionais no processo de estratégia da caixa 3. Foi ouvir diretamente um subconjunto de clientes — em grupo e em reuniões individuais — para que desafiassem premissas de longo prazo da empresa e dessem sugestões instigantes para o crescimento futuro. Como resultado direto dessa interação, a firma redobrou o investimento numa unidade de negócios experimental que fornecia, a bancos na Índia, um software pronto para uso (e o adaptou para uso no mundo todo).

A Infosys apostou ainda mais na opinião de jovens trabalhadores. Montou um painel — o “Vozes da Juventude” — de gente de alto desempenho para participar de oito reuniões da cúpula gestora no ano. Ao criar a equipe, Murthy citou o que chama de “regra dos 30/30”: 30% dos envolvidos em qualquer discussão sobre estratégia devem ter menos de 30 anos de idade, pois são criativos e não estão presos ao passado. Além disso, a Infosys criou uma série de mecanismos originais de nome bacaninha — graffitis de estratégia, cafés de conhecimento, jam sessions, speed-geeking — para atrair continuamente milhares de jovens trabalhadores para o processo. Uma jam session, por exemplo, é uma mesa-redonda a ritmo acelerado na qual cada pessoa tem apenas um minuto para dar uma resposta instantânea a perguntas como “Qual a saída para a Infosys vencer em mercados emergentes?”. A empresa criou até um software que automatiza o processo de peneirar o imenso volume de respostas para identificar temas comuns e ideias originais. Segundo Murthy, a participação da nova geração já levou à criação de mais de dez projetos de P&D na empresa, em áreas como saúde, educação e sustentabilidade.




Accountability

Para ter sucesso na preservação (caixa 1), empresas de sucesso criam mecanismos para responsabilizar as pessoas por resultados. Quem faz o trabalho no prazo, dentro do orçamento e seguindo especificações recebe aumentos e promoções; quem não o faz provavelmente devia investir em outra carreira. Empresas com culturas de desempenho exigentes, como a GE, tendem a se sair muito bem na caixa 1. Mas, de novo, iniciativas para criar o futuro devem partir com o abandono do passado. Para permitir conjecturas sobre potenciais mudanças não lineares é preciso deixar de lado a estrita responsabilidade por resultados. E a melhor maneira de testar essas conjecturas é com experimentos disciplinados.

Em 1999, por exemplo, a IBM lançou uma iniciativa para multiplicar velocidades de processamento por um fator de 500. A conjectura da IBM era que a geração seguinte de supercomputadores não rodaria com um único chip ultraveloz, mas com imensas redes de chips comuns. Batizado de BlueGene, o aparelho da IBM rodaria, conforme imaginado, grandes simulações para cientistas que estudam mudanças climáticas, física de partículas, processos celulares e muito mais. A grande incógnita, no entanto, era a relação entre o número de processadores e o volume de comunicação entre eles. Havia o risco de que a rede que ligava todos esses chips se congestionasse como uma freeway em Los Angeles na hora do rush. Para saber exatamente quando isso ocorreria, a IBM desenvolveu um plano de testes sistemático. Primeiro, montou um protótipo com só dois chips. Depois, com quatro. E depois com oito. Com cada protótipo, fez testes disciplinados. Se o BlueGene fosse falhar, a IBM descobriria com o menor custo possível. Em 2007 a empresa conseguira criar um BlueGene com 212.992 chips, o supercomputador mais veloz do mundo.

Quando aprendem rápido (e com custo mínimo), líderes de iniciativas da caixa 3 tomam decisões melhores. Ou têm sucesso, ou desistem sem perder tempo nem gastar muito. Só que a experimentação disciplinada não é fácil. Como dissemos no livro O Outro Lado da Inovação, melhores práticas para o planejamento de experimentos são muito distintas de melhores práticas para operações em curso. É crucial, portanto, adotar métodos distintos para avaliar os resultados de iniciativas da caixa 3 e o desempenho de seus líderes.

Vejamos as consequências negativas de submeter um líder que atua na caixa 3 a uma avaliação de desempenho tradicional, focada em resultados. Já que há muita incerteza ali, é comum uma premissa se provar falsa, produzindo resultados decepcionantes e líderes que se colocam na defensiva. Tem fim o debate aberto, cessa a aprendizagem — e surgem decisões ruins. Em vez disso, um líder deveria ser responsável por aprender rapidamente com experimentos disciplinados que conduz na caixa 3. Devidamente administrada, essa forma de accountability não é nada indulgente. Exige um intenso raciocínio e a análise implacável de premissas.

A Infosys criou uma cultura muito forte de prestação de contas por resultados. Aliás, criou até um acrônimo para aquilo que espera de dirigentes de unidades de negócios: PSPD. Ou seja, que seus atos sejam previsíveis, sustentáveis, rentáveis e sem risco (“predictable, sustainable, profitable and de-risked”). No caso de novos serviços, a Infosys trabalha com outras expectativas — padrões que computam a maior incerteza, mas não são menos exigentes.

Em 2002, a Infosys criou um negócio fundamentalmente novo (caixa 3) para a empresa: a Infosys Consulting. Em vez de produzir software sob medida, esse braço de consultoria assessoraria o cliente na reformulação de suas operações: em vez de tratar com chefes de TI, trabalharia para gerentes gerais. O core business — a programação de software — era quase uma ciência; já a Infosys Consulting estava mais para arte.

Murthy e Nilekani sabiam que não era realista esperar que o novo serviço fosse imediatamente produzir resultados previsíveis, sustentáveis, rentáveis e sem risco. Daí terem poupado o braço de fóruns tradicionais de avaliação de desempenho e feito com que se reportasse a um conselho de gestores interno. Esse conselho buscava sinais claros de que a Infosys Consulting rumava para o sucesso. Esperava, por exemplo, uma tendência de elevação da receita por funcionário à medida que o tempo dedicado à venda de serviços caísse e o dedicado à entrega de serviços subisse. O conselho também alterou as expectativas sobre a exatidão de projeções para Infosys Consulting: em vez de 99% (o exigido de unidades estabelecidas), 50%, pelo menos a princípio. À medida que a equipe foi aprendendo, suas projeções naturalmente melhoraram.




Desenho organizacional

Para alcançar a excelência no dia a dia (caixa 1), não basta contratar e treinar gente destacada. É preciso otimizar a maneira como as pessoas colaboram — através de especificações de cargos, estruturas organizacionais e processos de trabalho. Quando todos os indivíduos estão perfeitamente alinhados, a empresa vira uma obra de arte. No entanto, uma obra de arte na caixa 1 também é uma máquina altamente especializada. Como tal, não é realista esperar que consiga simplesmente “assimilar” um projeto da caixa 3. Equipes especiais são essenciais. O primeiro passo para montar uma é uma ação na caixa 2: abolir práticas organizacionais padronizadas. Um projeto da caixa 3 requer uma subunidade montada sob medida, do zero.

Montar uma subunidade dessas é um ato de criação ainda mais importante do que gerar uma ideia revolucionária na caixa 3. Como explicamos em “Acabe com a guerra da inovação” , é mais ou menos como erguer uma nova empresa do zero. Gente de fora exerce um papel crucial ao aportar novas habilidades e catalisar a mudança. São fortes agentes da caixa 2, pois naturalmente questionam velhas verdades.

Já que a Infosys Consulting era um projeto da caixa 3, Murthy e Nilekani criaram uma subunidade separada. Trouxeram, de fora, um executivo com 15 anos de experiência em consultoria para liderar a iniciativa, além de vários altos sócios de outras consultorias. Em vez de criar uma unidade com base na estrutura organizacional corrente da Infosys, estudaram os processos e desenhos organizacionais de outras empresas e adaptaram isso tudo ao modelo de fornecimento global. Hoje, a Infosys Consulting tem mais de US$ 100 milhões em receita ao ano.

Esse resultado foi muito mais favorável do que o registrado quando uma das três grandes montadoras americanas estreou na Índia, no início da década de 1990. O tremendo vão econômico entre a Índia e os EUA exigia uma abordagem de caixa 3 à produção de um automóvel. Só que, em vez de criar uma subunidade do zero para tocar a iniciativa no país, a montadora projetou o carro em Detroit e, para cortar custos, decidiu colocar vidros elétricos só nas portas dianteiras. Embora a decisão parecesse sensata a princípio, um indiano que podia comprar um carro naquele então também podia ter um motorista. Sentado no banco de trás, o dono do carro tinha de abrir a janela manualmente. É uma razão para que essa montadora americana ainda seja bem irrelevante num dos mercados automotivos que mais crescem no mundo.


Priorização para o longo prazo

Como já dissemos, o segredo para vencer a longo prazo está em saber o que esquecer e o que criar. Ainda assim, toda iniciativa na caixa 3 exige um primeiro passo difícil: o compromisso com o lançamento. Transferir recursos do presente para o futuro pode ser o maior desafio de um presidente, dadas as enormes pressões de curto prazo que comumente enfrenta.

Lá no começo, a Infosys tinha um cliente do ranking Fortune 10 que respondia por 25% do faturamento e vinha exigindo sérias concessões no preço. Murthy disse não e aceitou um golpe devastador para o desempenho no curto prazo. Sua lógica era simples: a Infosys jamais aceitaria cobrar um preço baixo a ponto de ter de sacrificar a qualidade do serviço ou cortar investimentos em pessoal, tecnologia, formação e P&D. Pelo seu raciocínio, isso só iria prejudicar a marca e minar o futuro da empresa.

No curto prazo, no entanto, as pressões mais intensas não vêm de clientes, mas do mercado financeiro, que exige um crescimento confiável do lucro e premia profusamente o presidente que entregá-lo. Esse forte incentivo na caixa 1 solapa as forças da destruição e da criação, pois o impacto de projetos da caixa 3 sobre os resultados inevitavelmente é negativo a princípio. Além disso, o mandato de um presidente é curto em relação ao ritmo de iniciativas de transformação. Quando um projeto da caixa 3 por fim se paga, muitos já se aposentaram; logo, a tentação é focar no imediato e sair por cima.

Murthy, pelo contrário, encara a Infosys como um projeto para toda a vida. Sua abordagem junto a investidores tem sido firme: promover incessantemente o potencial a longo prazo; anunciar imediatamente decepções de curto prazo. Murthy deu a má notícia da perda daquele grande cliente aos investidores em 48 horas. Isso feito, voltou a buscar o justo equilíbrio entre as forças da preservação, da destruição e da criação. Esse equilíbrio é o segredo para o domínio que a Infosys tem tanto do presente como do futuro, e deve ser a base para qualquer instituição de negócios que queira sobreviver por gerações.

________________________________

Vijay Govindarajan (vg@dartmouth.edu) é titular da cátedra Earl C. Daum 1924 Professor of International Business e diretor-fundador do Center for Global Leadership da Tuck School of Business (Dartmouth College), nos EUA. Foi o primeiro professor-residente e consultor de inovação da General Electric. Chris Trimble (chris.trimble@dartmouth.edu) é professor da Tuck School of Business e especialista em inovação em organizações estabelecidas. Os dois são autores de O Outro Lado da Inovação: a Execução Como Fator Crítico de Sucesso (Campus, 2010).