16 de jul. de 2010

OS GUARDIÕES DE NEURÔNIOS

Neurônios são células altamente especializadas, que não se reproduzem a torto e a direito e não podem ser repostas. Por isso, faz sentido a natureza ter desenvolvido mecanismos para tentar preservá-las. Um desses mecanismos podem ser os príons celulares.
Quem já ouviu falar em príons, logo associa com a doença da vaca louca, a encefalopatia espongiforme bovina que se disseminou pelo Reino Unido nos anos 1980. Pessoas que se alimentaram com carne de animais contaminados desenvolveram uma doença fatal, chamada variante da doença de Creutzfeldt-Jakov, que matou mais de 150 pessoas naquele país.
Doenças como Creutzfeldt-Jakov são causadas por príons infecciosos, proteínas cujo formato é alterado e afetam o sistema nervoso, causando tremores e perda de memória. Foi isso que chamou a atenção dos pesquisadores. Se o príon infeccioso causa perda de memória, o que fazem os príons normais, os chamados príons-células?
"Sabemos hoje que príons celulares têm várias funções no organismo e estão envolvidos no processo de formação das memórias de curto e longo prazos", explica a pesquisadora Vilma Regina Martins, do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer de São Paulo. Esses príons ficam ancorados na superfície da célula, como se fossem uma plataforma, à qual outras proteínas vão se ligando. "Quando o príon se liga a uma proteína chamada STI-1, esse complexo promove a síntese de proteínas nas extremidades do neurônio, ou seja, nas regiões envolvidas na formação de novas conexões, na formação de memória."
Estudos recentes indicam que os príons têm um papel protetor, evitando a perda neuronal. Camundongos modificados para não ter príons celulares no cérebro são menos resistentes a situações de estresse, a exemplo da privação do fluxo de sangue - como acontece nos derrames e isquemias - exposição ao álcool ou a drogas que provocam convulsões.
Vilma explica que os príons infecciosos têm conformação diferente dos celulares, não são solúveis e induzem os príons sadios a assumir a mesma forma alterada. Esses príons infecciosos formam agregados, as chamadas placas amilóides. Placas amilóides semelhantes, constituídas por outras proteínas alteradas, por exemplo, são características de doenças neurodegenerativas importantes, como o mal de Alzheimer. "Uma das hipóteses é que essas placas seriam uma forma de a célula remover do sistema elementos tóxicos, como proteínas alteradas e fragmentos dessas proteínas. Quando esses fragmentos se ligam à proteína príon, ocorre a morte do neurônio." É isso que causa os tremores e a perda de memória.
Os príons celulares podem ser um alvo terapêutico no futuro: impedindo sua ligação com aqueles fragmentos protéicos, se poderia evitar a morte de neurônios que caracteriza o mal de Alzheimer.