6 de jan. de 2008

MUDAR O JEITO DE MUDAR

ABRAHAM SHAPIRO

Quando foi a última vez que você sentiu estar no total controle de si mesmo? Você consegue se controlar? Tem domínio sobre seus atos, desejos? Não lhe conheço, infelizmente, mas uma das coisas que sei a seu respeito é que você não tem controle sobre seus pensamentos.

Nos dias atuais, quase todos somos controlados por alguma força externa: circunstâncias, mídia, marketing, idéias massificadas, conquistas não alcançadas, dinheiro, instituições, governos, sei lá o que mais; muitíssimo pouco ou quase nada por nós próprios. Vivemos iludidos de que exercemos sobre nós algum controle.

Fantasiamos que estamos no comando de nosso raciocínio e sobre esta mentira dormimos e acordamos dia-a-dia. Mal estamos ajustados à realidade do tempo. Hora estamos no passado – com lamentações, saudades, insatisfações – hora no futuro – procrastinando obrigações atuais, planejando o que ainda não atingimos, sonhando com o sucesso e conquistas. Isso não lhe soa familiar? Está aí a descrição do modo de vida – ou de morte, não sei – deste século: simples existência entorpecida por ilusões que nos cegam em relação a quem somos, o que fazemos, em que tempo vivemos e porque estamos aqui.

Onde fica o tempo presente? O que é o tempo presente? Quem o está vivendo? Você? Não. Eu? Caso eu viva um fantástico equilíbrio entre corpo e alma, sim. Converso todas as semanas com empresários, gerentes, executivos, colaboradores de todos os tipos de empresas. Não enxergo um sequer que tenha domínio equilibrado e prazeroso sobre o que pensam ou se propõem gerir ou conduzir. Estão, em geral, em busca incessante de algo que imaginam faltar e não sabem bem o que é. Parece que não estar satisfeito e contente é um padrão a ser seguido. Assemelham-se a peixes num rio poluído com seus corpos imerso na água e a boca buscando desesperadamente oxigênio do ar externo, já que não o encontram em seu próprio habitat. O lado triste é que muitos – senão todos – mal sabem o que buscam.

Planos, gráficos, resultados, tendências, visões, futuro, futuro, futuro. O hoje, a experiência da realidade, talvez sejam vistos por um breve lapso de tempo ao final do ano quando se dão uma olhada nos números, calculam-se os lucros e brindam o ano seguinte. Será o presente um número, um balanço contábil? E as atitudes, os estímulos, a apreciação do que já se alcançou, o esforço empreendido, as experiências, as lições?

Nossas sensações nos escravizaram. É escravo aquele profissional que se submete a um trabalho degradante, que lhe destrói a saúde, a família, os valores pessoais só pela garantia de um salário – salário, aqui, como poder, status. Hoje, mais do que viver é consumir. Por onde anda aquela brava postura de viver sem saber o que vai acontecer caso se tente algo novo amanhã?

Bem, a essas alturas você deve estar me reputando como um pregador de auto-ajuda. Sei que você e todos os demais leitores estão carecas de saber o que estou comentando. Todo mundo sabe, mesmo, intelectualmente. Mas por que não mudam? É que mudar é bem mais difícil.

Vejo amigos que há anos fazem terapia e até se desesperaram por entender claramente as razões que os levam a um tipo de comportamento destrutivo, mas continuam vivendo suas vidas sem sentido algum, fúteis e valendo, a seus olhos, bem menos que as ações em que investem na bolsa. Entender não é bastante.

Mudar é o processo mais difícil na vida. Mudar o funcionamento da mente – desta mente que foi moldada desde que éramos feto – é só o que pode fazer de nós as pessoas que devemos e necessitamos ser. Cultivamos a idéia de que mudar é criativo e que nos move para frente. Mas há momentos em que devemos parar e nos darmos conta de uma verdade de que nos afastamos há muito tempo: somos seres limitados, não somos os “deuses” que achamos ser. Aceitar nossas limitações e quebrar nosso orgulho, nossa auto-suficiência e prepotência é o princípio de uma poderosa, útil e salutar mudança que nos fará retornar à condição de seres humanos.

Mudar com calma. Mudar sabendo que a dor não dura para sempre, que o prazer não dura para sempre, que os objetos porque lutamos com sangue para adquirir não valem nem a milionésima parte da vitalidade que renunciamos para consegui-los.

Mudar através da alegria e da apreciação por tudo o que não temos olhos para ver e que, no entanto, há de permanecer enquanto vivermos e depois, ainda. Dizem que jamais existiu um milionário que, no leito de morte, tenha lamentado por não ter passado mais tempo em seu escritório ou fábrica. Mas por ter perdido a infância dos filhos, o amor da mulher amada, a sabedoria das coisas vividas com significado, a natureza. Ser feliz e ter paz interior. Ter a consciência de que não podemos controlar tudo e todos.

Quem tem poder maior que aquele que domina as próprias paixões? Qual império é maior que o daquele homem que se autodomina? Podemos e devemos almejar o controle do modo como iremos lidar com o mundo a fim de fazer dele um lugar melhor. Este é o alvo! Sem cobiça, sem ansiedade pelo futuro, sem sofrimento pelos números não atingidos, sem nostalgias corrosivas.

O presente está vazio, está pronto para ser preenchido. A qualidade e o sentido que dermos a cada atitude é que nos proporcionarão a sensação de dias plenos, de semanas realizadas e completas, de metas atingidas com equilíbrio e paz. Assim, sim: freando a corrida da vida rumo ao precipício do nada, descobrindo quanto é bom não ter idéia do que vai acontecer daqui a pouco - o que, aliás, é ótimo não saber. Eu sempre acreditei nisso, mas tinha medo. Hoje eu comecei a mudar.
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Abraham Shapiro é consultor e coach de líderes. Sua filosofia de trabalho, em uma só palavra, é: simplicidade. Contatos: shapiro@shapiro.com.br ou (43) 8814 1473