2 de out. de 2008

PALAVRAS DESGASTADAS I - PARCERIA

ABRAHAM SHAPIRO

Tem palavras que, de tão usadas, já estão saindo pelos ouvidos. Isso é ruim, pois perdem o sentido original e se tornam o oposto do que realmente significam. Um exemplo? Parceria.

Tem uma empresa lá nos pampas do Rio Grande que não tinha como abrir espaço no mercado concorrido que visava atender. O que fez? Pôs seus vendedores a oferecerem uma parceria aos clientes potenciais. A idéia era boa e bem formatada, no princípio, um modo inteligente de entrar, conhecer compradores e iniciar um diálogo com ótimas possibilidades de negociação. A conversa era bem programada e os benefícios visíveis e concretos.

Conseguiram! A palavra "parceria" foi mágica, afinal quem não deseja ter um parceiro de negócios no sentido real da palavra? No dicionário, parceiro é "aquele que não apresenta, ou quase não apresenta diferença em relação a outro; igual, semelhante, par".

Tudo ia muito bem. Tão bonito quanto fotos de casamento em coluna social – aquelas que fazem pensar que felicidade de casal é eterna: pais, mães, amigos, gestos, ares e poses. Vá vê-los na semana seguinte! (Valha-me, Nelson Rodrigues.)

Pois é! A vida não tem nada coluna social - negócios, muito menos! Têm data de entrega, padrão de qualidade e um conjunto imenso de detalhes a serem cumpridos. Quando há um contrato, multas são previstas em caso de descumprimento dos tratos. Sem contrato, as alternativas que o comprador oferece ao fornecedor são: "cumpra o pedido, ou pulamos para os seus concorrentes com a velocidade de um raio".

Foi exatamente o que aconteceu. A tal empresa pisou na bola. Não uma, mas várias vezes. Mercadorias fora de especificação, atrasos, cancelamentos e um milhão de barbaridades imperdoáveis. E mais: nem se dignavam a dar um telefonema de satisfação - coisas de gente irresponsável.

Balanço final: clientes fecharam portas até então estavam escancaradas. O tal fornecedor, hoje regionalmente reconhecido como um autêntico caloteiro - vive a amargura de ter que renovar grande parte da carteira de clientes. Notícias ruins correm, compradores "trocam figurinhas" entre si e a Internet é um brinquedinho perigoso nas mãos de insatisfeitos. Os vendedores, desmoralizados e atônitos, hoje buscam uma recolocação profissional.

Conseguir novos clientes com a "barra suja", hoje em dia, é um desafio que nem o Superman e o Batman, juntos, podem vencer.

E a parceria? Virou uma senha para tirar aqueles enganados compradores do sério. O de uma certa empresa passou a manter uma arma municiada na gaveta da escrivaninha, pronta para uso. Segundo ele, parceiros são terroristas disfarçados. Esse é o estado psicológico que resultou após ele quase ter ido para a rua por causa do fornecedor-parceiro que arranjou.

Quanto ao dicionário? Bem, dicionários não fecham negócio algum. E nem pagam contas. A verdade verdadeira é que, por enquanto, "os que pagam contas" fazem negócios com qualquer um que aparecer. Só não mais com parceiros.
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Abraham Shapiro é consultor e coach. Suas principais atuações são junto de líderes empresariais e times de vendas. Contato: shapiro@shapiro.com.br