29 de abr. de 2014

ENTREVISTA COM ELIE HORN - CYRELA BRAZIL REALTY

ABRAHAM SHAPIRO


Elie Horn é um dos empresários de maior sucesso no setor de construções do país. Ele é diretor presidente da Cyrela Brazil Realty.  Em uma de suas raras entrevistas à imprensa,  fez revelações importantes e que merecem ser analisadas e aprendidas.
Fiz um apanhado geral de suas falas mais significativas e as publico a fim de que meus leitores e ouvintes façam bom proveito.
Vamos à seleção:
1.      A chance de quebrar a cara numa época de crise é muito maior do que a de ganhar com ela. Por uma questão de sensatez, o melhor é ficar quieto. Aprendi que a melhor maneira de lidar com esta situação é se recolher, esperar as coisas acontecerem e sobreviver. Se você sobrevive, consegue ganhar depois. Se não sobrevive, não vai ganhar nunca. O negócio é pensar que o melhor lucro será o lucro futuro, e não o presente.
2.      Aprendi a apanhar, calar a boca e não ter orgulho. Talvez seja a maior lição que uma crise traz para todos. Em geral a humanidade é arrogante. Mas uma crise faz todo mundo pagar o preço. Teve gente que pagou muito no passado. Outros pagaram pouco, mas todo mundo pagou. Quando a crise de 2008 começou, ouvi palestras e conversei com uns 100 especialistas. A verdade é que ninguém conseguia prever nada. E nunca consegue. Para mim, é uma lição divina para a humanidade, que diz: "Fique mais quieto, não seja arrogante, seja mais humilde, não pense só no lucro".
3.   É preciso cortar custos, aprender a trabalhar com metas menores de crescimento - aliás, muito menores. Vou falar um negócio estranho: se você lançar muitos produtos pode quebrar a cara. O meu negócio na área de construção por definição tem fluxo de caixa negativo. Se amanhã faço um prédio e vendo tudo, mesmo assim o fluxo de caixa será negativo. Terei de comprar um terreno, fazer o lançamento, arcar com despesas comerciais, tocar a obra e no começo o dinheiro que recebo é menor do que o dinheiro que gasto.
4.     Por isso, eu monitoro o caixa o tempo todo. Normalmente quando uma crise chega, ela vem muito rápido e ninguém está preparado para paradas bruscas nas vendas. Num mês, vendas absurdas. De repente, a crise derruba as vendas pela metade de um dia para o outro.
5.    Quando tem crise, a gente para, fica bonzinho. Quando tem boom, a gente acelera. Não quero ir contra a crise, não quero ser herói de causas perdidas. Não adianta falar agora: "Vou vender de qualquer maneira". Quem diz isso é ignorante ou estúpido. Em toda crise falta dinheiro, falta demanda. Fazer o quê? A prioridade, nestas horas, é preservar o nome, a honradez, a empresa.
6.    Para as pessoas que trabalham comigo é sempre muito difícil entender uma crise, é um inferno. A luta interna é muito pior do que a externa. As pessoas não conseguem entender o cenário macro. Lá fora havia sintomas da crise desde julho de 2007. Os sintomas americanos estavam muito claros, e o fato de mantermos contato contínuo com economistas, analistas e banqueiros que vêm todo dia aqui fez com que percebêssemos o que ia acontecer. Não sabíamos com que intensidade nem com que rapidez, mas sabíamos que a tempestade chegaria. Quanto mais perto a crise chegava, mais eu me dedicava a entendê-la. Mas valeu a pena. Se amanhã ficar claro que erramos um pouco nas previsões, podemos até perder um pouco de participação de mercado. Mas é melhor perder mercado do que perder as calças.
7.   Tudo o que a empresa faz hoje tem relação com o conceito de perenidade. Estou com 64 anos. Trabalho para que a empresa sobreviva 1 000 anos. Hoje mesmo tivemos uma reunião estratégica na qual discutimos como a empresa vai sobreviver às crises que virão no futuro.
8.      Recentemente, a Cyrela divulgou a previsão de resultado do quarto trimestre. O mercado reagiu mal e as ações caíram 5% em apenas um dia. Sabe como é que o senhor lidar com esse tipo de pressão? A primeira vez em que o namorado pega na sua mão da namorada, ela sente uma emoção forte. Na segunda vez, aposto que não é a mesma coisa... E depois, vai sendo cada vez diferente... Com os analistas é a mesma coisa. Na primeira vez em que eles falam sobre sua empresa você vai atrás. Hoje já não presto muita atenção nisso, caso contrário mataria a empresa. É preciso olhar as reações do mercado com bom senso para que a companhia se preserve. Os números de vendas caíram - e era natural que isso ocorresse. Quero saber quem é o herói que consegue vender mais na crise. Eu não sei como se faz isso. Quero aprender. Se você me ensinar, agradeço.
9.      Trabalho seis dias por semana, numa média de 15 ou 16 horas por dia. Durmo 5, 6 horas e acabou. O resto é trabalho. Isso tem sido minha rotina há 46 anos. Aos sábados, eu paro. É uma bênção, porque é o único dia em que sou obrigado a parar. Aos sábados, leio, me espiritualizo, converso e passo meu tempo em casa. É o único dia em que estou livre, em que não sou escravo. Nos outros dias da semana sou escravo, no bom sentido. Domingo é dia de produção normal.
10.  Não revelo meu ponto fraco pra ninguém. Não posso. O importante é não repetir os nossos erros. Errar é humano, perseverar no erro é diabólico. Se você repete um erro, você é burro.
11. Quando um negócio não dá certo, calo a boca, tento aprender com os erros e faço outra coisa. Estou acostumado a perder e seguir em frente. Se não for humilde, vou apanhar mais. O humilde sofre menos porque está acostumado a apanhar. Tive uma aula de religião muito boa ontem. Sabe o que eu aprendi? “O que é este mundo? Por que Deus o criou? A resposta, em uma palavra, é: teste. Sou testado o tempo todo como homem, pai, marido, empresário, construtor. O teste consiste em evoluir, cada um na sua profissão, e deixar o mundo um pouco melhor do que quando chegamos a ele. Deus criou o homem imperfeito de propósito, para que ele possa melhorar o mundo. Se você acerta mais do que erra, você já evoluiu. Se for o contrário, você é um desastre.
12. O tipo de executivo que eu gosto de ter trabalhando ao meu redor? Primeiro tem de ser honesto. Depois tem de ter boa índole e ser trabalhador. O mais importante é o caráter. A inteligência vem depois. E tem de vestir a camisa da empresa.
13.  Deus cria seres diferentes, com credos diferentes, para cada um, no fim, chegar a Ele à sua maneira. Acredito em Deus e na missão humana. Qual a minha missão nesta Terra? Primeiro, fazer o bem. Grande parte do meu patrimônio, não vou dizer quanto, irá para a caridade. Meu pai doou 100% do que tinha. Como isso dá um significado ao trabalho? Eu posso transformar o produto do trabalho em dinheiro e depois usar o dinheiro para ajudar pessoas menos favorecidas. O dinheiro pode ser santificado, quando ajuda a salvar pessoas.
14.   Estamos aqui com a missão de ligar o espiritual ao material. Na hora em que você ganhou um tostão e esse tostão ajuda a salvar uma criança, você santificou e dignificou o dinheiro fruto de seu trabalho. Nessa hora, tudo o que parece ser egoísta deixa de ser.
15. Hoje, Bill Gates e Warren Buffett são os maiores heróis do empresariado e da filantropia. Eles deram o exemplo de como as coisas têm de ser e conseguiram unir as duas coisas. Ainda não está claro o que eu vou fazer. Parte da minha missão é fazer com que o homem se aproxime mais de Deus. Hoje ser crente está um pouco fora de moda, mas isso está errado. A gente não pode ter vergonha de acreditar em Deus. Se todos os homens fossem mais religiosos e respeitassem a ética e o bem, não haveria tanta violência no mundo, nem maldade nem pobreza. O que precisamos é fazer com que isso aconteça. Não é tão fácil, não é tão óbvio e não está na moda também. Mas essa é a nossa missão.

______________________ 

Abraham Shapiro é consultor e coach. Sua filosofia de trabalho, em uma só palavra, é "simplicidade". É autor do livro "Torta de Chocolate não Mata a Fome". E-mail: shapiro@shapiro.com.br Fone: 43. 8814.1473