Para fidelizar de verdade o cliente, esqueça mimos e supérfluos. Basta resolver seu problema.
Matthew Dixon, Karen Freeman e Nicholas Toman |
A tese de que a empresa deve “encantar” o cliente está tão enraizada que a gerência raramente faz uma pausa para examiná-la. Mas aqui vai uma pergunta: com que frequência alguém prestigia uma empresa só porque o atendimento é fora de série? É bem provável que o leitor lembre de um punhado de exemplos, como o do hóspede que faz questão de voltar a um hotel cujo pessoal é particularmente atencioso. Mas provavelmente não serão muitos.
Agora pergunte: quantas vezes um consumidor abandona uma empresa devido a um péssimo atendimento? O tempo todo. O consumidor se vinga da companhia aérea que extravia sua bagagem, da empresa de cabo cujos técnicos não aparecem na hora marcada, da operadora de celular que o deixa pendurado no telefone, da lavanderia que não entende o significado de “urgente”.
O impulso do consumidor a punir o atendimento ruim — pelo menos com mais presteza do que a premiar o atendimento primoroso — é altamente visível tanto na interação por telefone como no autoatendimento, maiores canais de serviço ao cliente da maioria das empresas. Nesses cenários, revela nossa pesquisa, a lealdade tem muito mais a ver com a capacidade da empresa de honrar sua promessa básica (por mais modesta que seja) do que com o espetacular que a experiência do atendimento possa ser. Mas a maioria das empresas não percebe isso e paga caro em termos de investimento jogado fora e clientes perdidos.
Para examinar o elo entre atendimento ao cliente e fidelidade, o Customer Contact Council (divisão do Corporate Executive Board) fez um estudo com mais de 75 mil indivíduos que haviam interagido por telefone com representantes de centrais de atendimento ou usado canais de autoatendimento como internet, atendimento telefônico automatizado, chat e e-mail. Também fizemos centenas de entrevistas estruturadas com líderes de centrais de atendimento e seu equivalente funcional em grandes empresas ao redor do mundo (veja detalhes no quadro “Nossa pesquisa”). Abordamos três questões:
• Qual a importância do atendimento ao cliente para a fidelidade?
• Qual a importância do atendimento ao cliente para a fidelidade?
• Que atividades do atendimento ao cliente aumentam a fidelidade e quais não?
• É possível aumentar a fidelidade sem elevar custos operacionais do atendimento ao cliente?
Houve duas constatações cruciais, que deveriam afetar a estratégia de atendimento ao cliente de toda empresa. A primeira é que encantar o cliente não produz fidelidade; reduzir seu esforço — o trabalho que deve fazer para ter seu problema resolvido —, sim. A segunda é que agir deliberadamente com base nesse insight pode ajudar a melhorar o serviço ao cliente, derrubar o custo do atendimento e reduzir a perda (“churn”) de clientes.
Esforço excessivo
Segundo a opinião popular, o cliente é mais fiel à empresa que se desdobra para agradá-lo. Nossa pesquisa sugere, no entanto, que superar expectativas do cliente durante interações de atendimento (oferecer um reembolso, um produto grátis ou uma cortesia como frete expresso sem custo adicional, por exemplo) só o torna marginalmente mais fiel do que quando suas necessidades são simplesmente satisfeitas.
Para o líder que faz carreira no setor de atendimento, é uma constatação alarmante. Que central de atendimento não tem uma parede recoberta de cartas e e-mails de clientes elogiando o esforço extra que alguém do atendimento fez em seu nome? Aliás, 89 dos 100 diretores de serviço ao cliente que ouvimos disseram que sua principal estratégia era superar expectativas. Mas, apesar desse esforço hercúleo — e caro —, 84% dos clientes nos disseram que sua expectativa não tinha sido superada na interação mais recente.
Uma razão para o foco na superação de expectativas é que nada menos que 80% das organizações de atendimento ao cliente usam índices de satisfação do cliente (ISC) como principal critério para avaliar a experiência do cliente. E é comum o gerente supor que, quanto mais satisfeito, mais fiel o cliente será. Mas, como outros antes de nós (sobretudo Fred Reichheld), vimos pouca relação entre satisfação e fidelidade. Em nosso estudo, 20% dos clientes “satisfeitos” disseram que pretendiam abandonar a empresa em questão; 28% dos “insatisfeitos” pretendiam continuar com ela.
O retrato fica ainda mais desolador. Embora não tenha muito efeito no aumento da fidelidade, o atendimento prestado pode contribuir muito para miná-la (e geralmente o faz). A probabilidade de um cliente sair de uma interação de atendimento infiel é quatro vezes maior do que a de sair fiel.
Outra maneira de pensar sobre fontes de fidelidade do cliente é imaginar duas esferas — uma contendo coisas que geram fidelidade e outra com coisas que geram infidelidade. A esfera da lealdade é formada basicamente de fatias como qualidade do produto e marca; a fatia do atendimento é bem reduzida. Já o atendimento responde pelo grosso da esfera da infidelidade. Prestigiamos uma empresa porque seus produtos são de qualidade, a relação custo-benefício é boa ou a marca é atraente. E, em geral, desertamos uma porque o atendimento ao cliente deixou a desejar.
Facilite as coisas
Voltemos à principal implicação de nosso estudo: em se tratando do atendimento, a empresa produz clientes fiéis basicamente ao ajudá-los a resolver eventuais problemas com rapidez e facilidade. De posse desse conhecimento, podemos alterar radicalmente a ênfase de interações de atendimento ao cliente. Formular o desafio de atendimento em termos de facilitar a vida do cliente pode ser altamente esclarecedor — libertador até —, sobretudo para empresas que vêm lutando para “encantar”. Mandar o pessoal na linha de frente superar expectativas do cliente tende a gerar confusão, perda de tempo e esforço, além de mimos onerosos. Instruí-lo a “facilitar as coisas” dá uma base sólida para a ação.
O que significa, exatamente, “facilitar as coisas”? Simplesmente remover obstáculos. Identificamos várias queixas recorrentes sobre interações de atendimento, incluindo três ligadas especificamente ao esforço feito pelo cliente. O cliente não gosta de ter de contatar a empresa várias vezes (ou de ser transferido) para que o problema seja resolvido, de ter de repetir informações, de ter de pular de um canal de serviço para outro (ter de ligar, por exemplo, depois de tentar em vão resolver o problema pelo website). Mais da metade dos clientes que ouvimos disse topar com dificuldades do gênero. Uma empresa pode reduzir esse tipo de esforço e medir o efeito com um novo indicador, o Índice de Esforço do Cliente (IEC), que usa uma escala de 1 a 5 na qual 5 representa esforço muito grande (para detalhes veja o quadro “Índice de Esforço do Cliente”).
Durante o estudo, vimos diversas empresas que tinham conseguido implementar um modelo de baixo esforço do cliente no atendimento. A seguir, cinco das táticas que empregaram — e que toda empresa deveria adotar.
1. Não se limite a resolver o problema presente — previna o seguinte. De longe, a maior causa do excesso de esforço pelo cliente é a necessidade de ligar de volta. Muitas empresas acreditam estar se saindo bem nesse quesito por terem um forte RPC, o índice de resolução no primeiro contato (veja o quadro “O que medir?”). Só que 22% das chamadas repetidas envolvem questões ligadas ao problema que motivou a chamada original — ainda que o problema em si tenha sido devidamente solucionado da primeira vez. Embora esteja aparelhada para prever e solucionar antecipadamente essas questões, a empresa raramente o faz, em geral devido ao foco excessivo em controlar a duração de chamadas. É hora de entender que, para calcular o esforço empreendido, o cliente computa não só como uma ligação isolada foi abordada, mas também como a empresa administra eventos de atendimento que se desdobram e normalmente exigem várias chamadas, como conseguir financiamento para um imóvel ou pedir a instalação de TV a cabo.
Para superar o desafio, a Bell Canada vasculhou dados da interação de clientes com a empresa. A ideia era entender a relação entre distintos problemas vividos pelo cliente. Graças ao que aprendeu sobre “clusters de eventos”, a Bell passou a treinar o pessoal do atendimento para não só resolver o principal problema do cliente, mas também para prever e solucionar questões posteriores comuns. Uma alta parcela dos clientes que contratavam um recurso especial, por exemplo, ligava de volta para saber como usá-lo. Agora, o pessoal do atendimento dá uma rápida explicação ao cliente sobre os principais aspectos do recurso antes de desligar. Esse tipo de resolução antecipada permitiu à Bell reduzir em 16% o total de “chamadas por evento” e em 6% a perda de clientes. Para questões correlatas complexas, que se abordadas na primeira chamada consumiriam tempo demais, a empresa envia e-mails — explicando, por exemplo, como interpretar a primeira conta recebida. Agora, a Bell Canada está aplicando essa abordagem de previsão de problemas à experiência de direcionamento de chamadas para o cliente.
A Fidelity usa um conceito similar em seu site de autoatendimento, sugerindo “próximos passos” ao cliente que executa certas operações. Quando faz uma troca de endereço pela internet, o cliente costuma ligar depois para pedir novos talões de cheque ou informações sobre seguro residencial; logo, a Fidelity o direciona para esses tópicos antes que saia do site. Hoje, 25% das transações de autoatendimento no site da Fidelity têm origem em sugestões similares de “questões seguintes”; o total de ligações por domicílio caiu 5% desde que a política entrou em vigor.
2. Prepare o pessoal para lidar com o lado emocional da interação com o cliente. Em nosso estudo, 24% das chamadas repetidas resultavam do descompasso emocional entre clientes e atendentes — situações nas quais o cliente não pôs fé nas informações dadas pelo atendente, por exemplo, ou não gostou da resposta recebida e teve a impressão de que o funcionário estava se escondendo detrás da política geral da empresa. Com uma orientação básica, o atendente pode eliminar muitas questões interpessoais e reduzir, com isso, chamadas repetidas.
Uma instituição britânica de crédito imobiliário ensina o pessoal de atendimento a captar pistas sobre a personalidade do cliente. Os atendentes rapidamente determinam se estão falando com um tipo “controlador”, “refletido”, “emotivo” ou “artista” e adaptam sua resposta de acordo com isso, dando ao cliente a mescla de detalhe e agilidade adequada para a personalidade diagnosticada . Essa estratégia derrubou o total de chamadas repetidas em impressionantes 40%.
A empresa de iluminação Osram Sylvania vasculha o acervo de transcrições de chamadas para identificar termos que tendem a causar reação negativa e deflagrar novas chamadas — a palavra “não”, por exemplo — e orienta seus atendentes a refrasear a resposta. Em vez de dizer “Não temos esse item em estoque”, um atendente poderia explicar: “Teremos esse item em estoque em duas semanas”. Graças a mudanças simples como essas no discurso, a Osram Sylvania reduziu o Índice de Esforço do Cliente de 2,8 para 2,2 — 18,5% abaixo da média que vemos para empresas B2B.
A LoyaltyOne, operadora do programa de recompensa Air Miles, ensina o pessoal a extrair informações que ajudem a posicionar melhor um resultado potencialmente frustrante. Se está atendendo um cliente interessado em usar milhas para um voo não disponível e descobre que o interlocutor vai viajar para uma reunião importante de trabalho, o atendente pode usar o fato para dar um caráter positivo à necessidade de reserva em outro voo. Poderia dizer: “Ao que parece, esse compromisso não permite atrasos. O voo da manhã não está disponível, mas com a possibilidade de atraso, seria arriscado de todo modo. Sugiro um voo no domingo à noite para não haver o risco de perda da reunião”. Com essa estratégia, o volume de contatos repetidos caiu 11%.
3. Aumente o “stickiness” em canais de autoatendimento para minimizar a troca de canal. Muitas empresas perguntam “Como convencer o cliente a usar o site de autoatendimento?”. Nosso estudo mostra que, na verdade, muitos clientes já estiveram lá: 57% das chamadas feitas a uma central de atendimento são de clientes que foram primeiro ao website. Embora queiram que o cliente rume para a internet, muitas empresas relutam em fazer melhorias no site, por achar que apenas um gasto pesado e a atualização tecnológica segurarão o cliente ali (e mesmo quando se gasta com a modernização, a iniciativa em geral é contraproducente, pois a empresa tende a adicionar recursos complicados e confusos para tentar acompanhar as concorrentes).
O cliente pode ficar perdido com a profusão de canais de autoatendimento — resposta de voz interativa, websites, e-mail, chat, comunidades de suporte online, mídias sociais como Facebook e Twitter, e assim por diante. Além disso, em geral não está capacitado para decidir qual a melhor opção. Se deixado à própria sorte, por exemplo, um usuário tecnologicamente pouco sofisticado pode ir parar em comunidades de suporte online altamente técnicas. O resultado é que o cliente pode fazer um grande esforço pulando de um canal para outro só para apelar para o telefone no final.
Hoje, a Cisco Consumer Products direciona o cliente para o canal que, a seu ver, mais se ajusta a ele, com base em hipóteses específicas sobre cada segmento geradas pela equipe interna de experiência do cliente. Na página inicial do site, a linguagem usada empurra quem entende de tecnologia para comunidades de suporte online; quem tem menos tarimba técnica é direcionado ao banco de conhecimento com a promessa de instruções passo a passo simples. A empresa eliminou a opção e-mail ao constatar que não reduzia de forma inequívoca o esforço do cliente (nosso estudo mostra que é preciso 2,4 e-mails, em média, para resolver um problema, em comparação com 1,7 telefonema). Quando a Cisco Consumer Products iniciou o programa, em 2006, apenas 30% do contato com o cliente se dava via autoatendimento; hoje, o total é 84%. Já o volume de chamadas caiu.
Para reduzir o esforço do cliente, bastou à Travelocity melhorar a seção de ajuda do website. A empresa descobrira que muita gente que buscava soluções ali não encontrava e acabava recorrendo ao telefone. Ao eliminar jargões, simplificar a diagramação e aumentar a legibilidade de modo geral, a empresa fez dobrar o uso de suas “dúvidas mais frequentes” e reduziu em 5% o volume de chamadas.
4. Use o feedback de clientes contrariados ou com dificuldades para reduzir o esforço do cliente. Muitas empresas pedem a opinião do cliente ao final do atendimento para medir o desempenho interno; nem sempre, no entanto, usam os dados que coletam para aprender com clientes insatisfeitos. Mas vejamos o que faz a National Australia Group. A empresa tem atendentes especificamente treinados para ligar para clientes que deram nota baixa ao atendimento. Esse pessoal se concentra primeiro em resolver o problema do cliente, mas também busca ouvir sua opinião e usá-la para aprimorar o serviço. O índice de resolução de problemas na empresa subiu 31%.
O aprendizado e a intervenção não estão limitados ao canal telefone. Certas empresas monitoram o comportamento online para identificar clientes com dificuldades. A EarthLink tem uma equipe especial de atendentes que entram em cena conforme necessário no website de autoatendimento — iniciando, por exemplo, um chat com um cliente que esteja há mais de 90 segundos no centro de conhecimento ou tenha clicado no link “Fale conosco”. Esse programa derrubou em 8% o volume de chamadas.
5. Capacite a linha de frente a proporcionar uma experiência de baixo esforço. Sistemas de incentivo que valorizam mais a velocidade do que a qualidade podem ser a maior barreira à redução do esforço do cliente. A maioria das organizações de serviço ao cliente ainda enfatiza indicadores de produtividade como tempo médio de atendimento na hora de avaliar o desempenho de atendentes. Melhor seria se abolissem índices de produtividade que impedem que a experiência do cliente seja facilitada.
Uma empresa australiana de telecomunicações eliminou todo indicador de produtividade do painel de desempenho do pessoal na linha de frente. Embora o tempo de atendimento tenha subido ligeiramente, o volume de chamadas repetidas caiu 58%. Hoje, a empresa avalia os atendentes somente com base em breves consultas feitas diretamente a clientes, perguntando basicamente se o atendimento que receberam satisfez suas necessidades.
Livre para se concentrar em reduzir o esforço do cliente, o pessoal do atendimento pode facilmente marcar pontos fáceis. A Ameriprise Financial, por exemplo, pede que seus atendentes registrem todo caso no qual são obrigados a dizer não ao cliente. Ao fazer uma auditoria dos “nãos”, a firma descobriu várias diretrizes obsoletas devido a mudanças regulatórias ou a melhoramentos em sistemas ou processos. No primeiro ano de registro dos “nãos”, a Ameriprise modificou ou eliminou 26 diretrizes. De lá para cá, ampliou o programa: pediu que o pessoal do atendimento sugerisse outras eficiências em processos, gerando US$ 1,2 milhão em economia como resultado.
Certas empresas foram ainda mais longe, tornando o baixo esforço do cliente a pedra angular de sua proposta de valor de serviços e branding. O sul-africano Nedbank, por exemplo, adotou como promessa o mote “AskOnce”, o que garante que o atendente que primeiro pega o telefone se responsabilizará pelo problema do cliente do início ao fim.
A missão imediata é clara: o dirigente empresarial deve concentrar o braço de atendimento em reduzir o esforço do cliente para mitigar a infidelidade. Mas gerentes de atendimento em dúvida sobre a melhor maneira de reestruturar as centrais de contato — departamentos erguidos sobre a premissa de “encantar” o cliente — devem considerar o seguinte: há uma grande mudança em curso em termos de preferências de atendimento do cliente. Embora o grosso das empresas acredite que a esmagadora maioria dos clientes prefere o atendimento ao vivo via telefone ao autoatendimento, nossos dados mais recentes revelam que o cliente é, na verdade, indiferente. É um ponto de inflexão importante, que provavelmente prenuncia o fim do atendimento telefônico como principal canal de interação no atendimento ao cliente. Para gerentes de atendimento empreendedores, é uma oportunidade de reformular a organização em torno do autoatendimento e, no processo, colocar a questão da redução do esforço do cliente de uma vez por todas no centro das atenções, onde deveria estar.
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Os autores são professores da Harvard Business School, nos EUA.