11 de fev. de 2009

O QUE É VENDER?

ABRAHAM SHAPIRO

Quando entrei naquela loja de confecções masculinas do tradicional shopping center de S. Paulo, o vendedor que me abordou pareceu ser uma pessoa interessada. Iniciou seu atendimento do modo convencional, perguntando meu nome e como poderia ser-me útil. Eu me apresentei e disse que precisava de um terno.

- "Poderei ajudar melhor se o senhor me disser para qual ocasião" - ele completou.

Eu aprovei a intenção e declarei o que desejava:

- "É que darei uma palestra na Federação das Indústrias do Estado de S. Paulo, na noite de amanhã, e achei que o terno que eu trouxe comigo não está bom o bastante. Por isso, resolvi pesquisar a possibilidade de comprar algo mais adequado".

Ele, então, pediu-me que o acompanhasse.

Caminhamos loja adentro. Comecei a me sentir estranho quando as araras de ternos visíveis da porta da loja ficaram à minha esquerda enquanto andávamos. Não chegamos nelas. Ele levou-me a uma área mais ao fundo. Mediu meu ombro, meus braços e retirou de um cabide coberto um paletó preto que ajudou-me a vesti-lo. Aquela peça parecia feita sob medida para o meu corpo. Cabia com precisão em mim. Neste momento, a curiosidade fez-me olhar a etiqueta bordada no bolso interno esquerdo. Constatei o que eu mais temia. Tratava-se de um autêntico terno italiano, de uma grife finíssima - dessas que fariam um homem nu parecer-se impecavelmente vestido se levasse apenas a etiqueta colada a seu peito.

- "Oy vey iz mir!" - lamentei em voz alta, ao modo de minha mãezinha. Pensava no quanto dinheiro aquilo custaria. Então, com o "bolso encolhido" e o cartão de crédito temperamentalmente entristecido com a minha promiscuidade financeira, já quase fundido ao couro da carteira em que eu o alojo, voltei-me ao atendente e não me envergonhei de indagar:

- "Amigo, mesmo sem ter-me dito o preço, sou sábio em relação ao que só muito dinheiro pode comprar. Tenho percepção suficiente para lhe pedir quase implorando: haverá algo mais barato nesta loja que atenda a minha necessidade?"

Ao que ele redargüiu:

- "É claro que temos, senhor. Mas eu só lhe fiz esta indicação por que não poderia admitir que o senhor fosse ao "Olimpo da locomotiva econômica do país" trajando um terno comum. Um momento desta grandeza exige um produto perfeito, que proporcione a merecida visibilidade ao senhor".

Aquilo entrou em meus ouvidos de modo único, apropriado e justo. Eu percebi que ele estava sendo tanto verdadeiro como considerável, e que, acima de tudo, me valorizava de um modo que eu mesmo não havia cogitado até então. Mexia com a minha auto-estima. Eu tinha a sensação mais convicta e real de que era sincero o que me era dispensado. Não se tratava de "empurroterapia" proposital de vendedorzinho desesperado com uma meta de venda.

Enfim, perguntei o preço. Ao ouvir, exclamei outra interjeição típica de minha mãe:

- "Oy guevalt!"

O terno em questão era "apenas" doze vezes o valor de um "normal" segundo os meus hábitos regulares de compra !!!

Pensei, levei em conta o evento, pus minha reputação na balança, assim como a chance única e privada de brilhar. Pesei as potenciais consultorias que, após contratadas, me permitiriam cumprir o fluxo de pagamentos mensais daquele item probitivo da moda masculina. Seu valor despertaria as atenções de qualquer fiscal do Imposto de Renda.

Comprei. Decisão difícil que, após tomada, abre precedente para uma série de outros atos "corajosos" e, por que não dizer, desequilibrados de consumo. Observe a lista final de produtos: um terno, duas gravata, duas camisas, um par de sapatos, quatro cuecas e dois lenços. E não me pergunte a razão destes números. Freud não explicaria. Nem a Cabalá.

O resultado da brincadeira? Enquanto eu ministrava a palestra, noite seguinte, sentia a segurança que só a alta qualidade dos itens que compunham minha imagem me proporcionava. Era real. Eu fui aplaudido por cerca de duzentos e cincoenta dos grandes empresários da elite de S. Paulo e região.

Aquele vendedor cuidou de mim. Sua atitude ousada foi um exemplo real e autêntico de atendimento. Desde então, quando penso ou uso a expressão "profissional de venda" em meus treinamentos, a atitude que me inspira e exemplifico é a daquele homem. Foi uma lição.

Vender é isto!
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Abraham Shapiro é consultor e coach de líderes. Tem resultados na interação entre as áreas de vendas e marketing. Sua filosofia de trabalho, em uma só palavra, é: simplicidade. Contatos: shapiro@shapiro.com.br ou (43) 8814 1473