20 de mar. de 2011

NÃO SE DEIXE CEGAR PELOS NÚMEROS

Roger L. Martin

Empresas adoram números. Nenhuma proposta de estratégia está completa sem uma planilha detalhada traduzindo ações recomendadas em lucros. A capacidade de montar essas planilhas é uma das razões pelas quais administradores jovens e brilhantes frequentam escolas como Harvard e Stanford. Dali saem com habilidades quantitativas aguçadíssimas — habilidades que vão logo pondo em ação.

Nas últimas duas décadas, essa administração por números se disseminou. O imenso volume de dados colhidos pela TI e a crescente sofisticação da modelagem econométrica levaram quase todo indivíduo a acreditar que o sucesso da empresa dependia da quantidade de dados que possuía e da capacidade de modelá-los. Isso me faz lembrar a trilogia de ficção científica de Isaac Asimov na qual um matemático genial cria um modelo que traça o futuro da humanidade.

A meio caminho da trilogia, no entanto, o modelo deixa de funcionar — e o mesmo está ocorrendo hoje na vida real, obrigando educadores a repensar o modo como formamos os líderes empresariais de amanhã.

Cada vez mais, nos damos conta de que a estratégia é tanto questão de interpretação como de análise. Ao pensar nas perspectivas de um carro como o Mini Cooper, precisamos não só medir o consumo de combustível e o espaço interior do veículo, mas também levar em conta a beleza do design e o prazer de dirigi-lo. Dá para quantificar a oportunidade de geração de receita da violação da privacidade de usuários do Facebook, mas não há como medir a traição sentida por esses usuários.

Embora não possam ser reduzidos a números, fatores como design e confiança podem ser interpretados e compreendidos. Aliás, somente com essa compreensão seremos capazes de fazer distinções importantes entre essa ou aquela estratégia ou prever a resposta emocional de clientes a uma mudança de direção.

Grandes executivos entendem bem essa realidade. Peguemos o ex-presidente da P&G, A.G. Lafley, que atribui a decisão mais acertada de sua carreira a um juízo qualitativo. Em 1990, quando era gerente-geral de produtos de lavanderia, Lafley teve de decidir se a empresa migraria para o formato compacto de sabão, que estava transformando o mercado no Japão. O novo formato derrubaria custos de produção, embalagem e transporte da P&G e reduziria o espaço ocupado nas gôndolas e nos depósitos do varejo — tudo isso sem prejuízo para a receita.

Infelizmente, a análise de sondagens do consumidor sugeria que apenas uma pequena parcela do público preferia o novo formato. Mas Lafley foi examinar a informação qualitativa, lendo comentários de centenas de consumidores. Descobriu que, embora pouca gente manifestasse o desejo de um sabão compacto, a opinião do resto era indiferente — não negativa. Ou seja, a aposta na novidade agradaria a uma pequena minoria sem desagradar a maioria — e representaria um grande gol para a P&G. “A análise nunca produz uma resposta”, concluiu. “O máximo que pode fazer é embasar seu juízo.”

Lafley não está sozinho. É cada vez mais comum a empresa deixar de lado abordagens movidas a dados e buscar subsídios de disciplinas como a etnografia. Vai observar o consumidor interagindo com produtos. Dá câmeras e caderninhos ao consumidor para que este registre sua experiência. Vai visitar o consumidor em sua casa.

Esse tipo de abordagem exige competências totalmente novas. No futuro, o estrategista de sucesso terá uma noção holística e empática de clientes e será capaz de converter insights um tanto quanto vagos num modelo de negócios criativo que possa ser prototipado e revisto em tempo real. Para tanto, terá de ser um bom comunicador, aceitar de bom grado a ambiguidade e estar pronto para abandonar a busca de respostas simples, diretas ao ponto.

É isso que reitores de escolas de negócios como eu terão de ensinar daqui para frente.
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Roger L. Martin é reitor da Rotman School of Management (University of Toronto), no Canadá. É autor de The Design of Business.