6 de mai. de 2010

PARE DE FAZER PLANOS... COMECE A TOMAR DECISÕES.

Michael C. Mankins e Richard Steele 

Muitos executivos passaram a descrer do planejamento estratégico. Será de estranhar? Apesar de todo o tempo e energia dedicados ao processo, esse planejamento é, no mais das vezes, uma barreira à boa tomada de decisões, exercendo pouquíssima influência sobre a estratégia.

O colapso do planejamento estratégico se deve a dois fatores: ser, tipicamente, um processo anual e focado em divisões de negócios isoladas. Isso torna o processo imcompatível com o modo como um executivo toma decisões estratégicas importantes, que não são circunscritas ao calendário nem definidas pelos limites de cada divisão. Daí que executivos de 156 grandes empresas por nós sondados tenham dito que costumam tomar decisões estratégicas fora desse processo, em geral de modo ad hoc, sem análise rigorosa ou debate produtivo.

Mas é possível reparar o processo atacando o problema na raiz. Um pequeno número de empresas progressistas descartou o planejamento atrelado ao calendário e focado em divisões de negócios em favor de uma tomada de decisões contínua, voltada a questões, a problemas. Para tanto, aposta em vários princípios básicos: separar - mas integrar - a tomada de decisão e o planejamento, concentrar-se em certas questões cruciais e estruturar avaliações de estratégia para produzir  decisões reais.

Ao mudar o timing e o foco do planejamento estratégico, essas empresas mudaram também a natureza das discussões da cúpula gestora sobre estratégia - de "analisar e aprovar" para "debater e decidir", no sentido de que altos executivos ponderam seriamente toda grande decisão e suas implicações para o desempenho e o valor da empresa. Os autores descobriram que o número de decisões estratégicas importantes que essas empresas tomam anualmente é mais do que o dobro do tomado por quem segue o modelo tradicional de planejamento.



Na maioria das empresas, o planejamento estratégico não tem nada a ver com tomar decisões. É um registro de escolhas já feitas, acidentalmente.Certas empresas estão repensando sua formulação de estratégias para tomar decisões melhores, em maior número e com mais rapidez.
Planejamento estratégico é algo totalmente inútil? Esta foi a pergunta que o presidente de uma multinacional se fez recentemente. Dois anos antes, o executivo promovera uma ambiciosa reforma no processo de planejamento. A velha abordagem, que exigia dos chefes de divisões de negócios apresentações regulares ao comitê executivo, entrara em colapso. Os membros do comitê executivo - presidente, diretor de operações, diretor financeiro, diretor de tecnologia e diretor de recursos humanos - estavam fartos de assistir a infindáveis apresentações em PowerPoint que davam pouco espaço para que questionassem as idéias de cada divisão ou influenciassem suas estratégias. Os chefes de divisão, por sua vez, achavam os comentários do comitê pródigos em exortações, mas carentes de idéias viáveis. Pior, essas avaliações geravam pouquíssimas decisões úteis.

Já o novo processo trazia as últimas inovações em planejamento estratégico. Para evitar a sobrecarga de informações, cada divisão foi limitada a 15 slides de "alto impacto" que descrevessem a estratégia. Para garantir discussões proveitosas, toda apresentação e material de apoio teriam de ser repassados ao comitê executivo com pelo menos uma semana de antecedência. As sessões foram reestruturadas para deixar um tempo generoso para o diálogo entre a matriz e os executivos das divisões. E, em vez de obrigar esses últimos a se deslocarem até a sede, o comitê, numa decisão inédita, resolveu passar seis semanas todo segundo trimestre do ano visitando as 22 divisões para reuniões de dia inteiro. A meta era tornar as avaliações mais longas, mais focadas, mais conseqüentes.

Não funcionou. Depois de dois ciclos de planejamento com o novo processo, o presidente consultou a opinião dos envolvidos com uma sondagem anônima. Para sua decepção, recebeu um rol de queixas: "É muito demorado." "O nível é alto demais." "Não tem nada a ver com o modo como tocamos o negócio". O pior foi a constatação quase universal de que a abordagem gerava pouquíssimas decisões de fato. O presidente ficou atônito. Como era possível que o arrojado processo de planejamento deixasse tanto a desejar? E que providências deveria tomar para que o planejamento estratégico levasse a decisões melhores, em maior número e com mais rapidez?

Tal como esse presidente, muitos executivos passaram a descrer do planejamento estratégico. Será de estranhar? Segundo a pesquisa, apesar do tempo e da energia dedicados ao planejamento estratégico, o processo é, no mais das vezes, uma barreira à tomada de decisões. Conseqüentemente, não influencia de fato a estratégia da maioria das empresas.

Iremos mostrar aqui que o fracasso generalizado do planejamento estratégico se deve a dois fatores: ser, tipicamente, um processo anual e, em geral, focado em divisões de negócios isoladas. Isso torna o processo imcompatível com o modo como o executivo toma decisões estratégicas importantes, que não são circunscritas ao calendário nem definidas pelos limites de uma divisão. Não surpreende, pois, que altos executivos costumem passar por cima do processo de planejamento. Tomam decisões que moldam a estratégia da empresa e determinam seu futuro - decisões sobre fusões e aquisições, lançamento de produtos, reestruturação interna - fora do processo, em geral de modo ad hoc, sem análise rigorosa ou debate produtivo. Decisões críticas são tomadas de modo incorreto ou não são tomadas. Mais do que qualquer outra coisa, tal descompasso - entre como o planejamento funciona e como se dá a tomada de decisões - explica a frustração,  se não a antipatia cabal, da maioria dos executivos diante do planejamento estratégico.

Mas é possível reparar o processo atacando o problema na raiz. Um pequeno número de empresas progressistas descartou o planejamento atrelado ao calendário e focado em divisões de negócios em favor de uma tomada de decisões contínua, voltada a questões, a problemas. Ao mudar o timing e o foco do planejamento estratégico, mudaram também a natureza das discussões da cúpula gestora sobre estratégia - de "analisar e aprovar" para "debater e decidir", no sentido de que altos executivos ponderam seriamente toda grande decisão e suas implicações para o desempenho e o valor da empresa. Essas empresas usam o processo de desenvolvimento estratégico para nortear a tomada de decisão. Logo, o número de decisões estratégicas importantes que tomam anualmente é mais do que o dobro do tomado por quem segue o modelo tradicional de planejamento (veja o quadro "Quem toma mais decisões?"). Essas empresas pararam de fazer planos e passaram a tomar decisões.

Onde o planejamento dá errado
No segundo semestre de 2005, a Marakon Associates, ao lado da Economist Intelligence Unit, fez uma pesquisa com altos executivos de 156 grandes empresas do mundo todo com receita de US$ 1 bilhão ou mais (em 40% delas, mais de US$ 10 bilhões). Perguntamos como a empresa de cada um desenvolvia planos de longo prazo e com que eficácia, na opinião deles, o processo de planejamento norteava as decisões estratégicas da empresa.

Os resultados da pesquisa confirmaram o que havíamos observado em anos de consultoria: o timing e a estrutura do planejamento estratégico são obstáculos a uma boa tomada de decisões. Constatamos que empresas com processos e práticas de planejamento típicos tomam apenas 2,5 grandes decisões estratégicas ao ano, em média (por "grande", queremos dizer decisões com potencial para aumentar o lucro em 10% ou mais a longo prazo). É difícil imaginar que, com tão poucas decisões estratégicas nutrindo o crescimento, essas empresas possam seguir avançando e produzindo o desempenho financeiro esperado por investidores.

Pior, suspeitamos que as poucas decisões tomadas por essas empresas ocorrem apesar do processo de planejamento estratégico, não devido a ele. Aliás, o modelo tradicional é tão inflexível e fora de sintonia com o modo como um executivo deseja e precisa tomar decisões que a alta cúpula com demasiada freqüência passa por cima do processo ao fazer suas maiores escolhas estratégicas.

Com as grandes decisões sendo tomadas fora do processo, o planejamento estratégico vira uma mera codificação de coisas já decididas pela cúpula gestora, e não um veículo para identificar e debater decisões cruciais a serem tomadas pela empresa para obter um desempenho superior. Com o tempo, os gestores passam a questionar o valor do planejamento estratégico, a evitá-lo e a apostar em outros processos para definir a estratégia.
 
O efeito calendário. Em 66% das empresas por nós sondadas, o planejamento é um evento periódico, um precursor dos processos anuais de orçamento e aprovação de capital. Aliás, atrelar o planejamento estratégico a esses outros processos de gestão é freqüentemente citado como a melhor prática. Mas submeter o planejamento estratégico ao ciclo anual pode torná-lo irrelevante para executivos que devem tomar muitas decisões importantes no ano.

Um cronograma tão rígido tem dois grandes inconvenientes. O primeiro seria o problema do tempo. Um planejamento realizado uma vez por ano não dá a executivos o tempo suficiente para tratar de questões que mais afetam o desempenho. Segundo nossa pesquisa, empresas que seguem um calendário de planejamento anual dedicam menos que nove semanas por ano ao desenvolvimento de estratégias. Ou seja, é pouco mais de dois meses para coletar fatos relevantes, definir prioridades estratégicas, pesar alternativas e tomar importantes decisões estratégicas. Muitas questões - sobretudo as que pegam várias divisões de negócios, transpõem fronteiras geográficas ou envolvem cadeias de valor inteiras - não podem ser resolvidas de modo eficaz num intervalo tão curto. A Boeing, por exemplo, levou quase dois anos para decidir se terceirizaria atividades de suma importância como a fabricação de asas.

Limitados pelo calendário de planejamento, os executivos têm duas alternativas: não tratar de problemas complexos - ou seja, jogá-los no cesto de coisas "difíceis demais" - ou enfrentá-los através de outro processo que não o planejamento. Nos dois casos, o planejamento estratégico é marginalizado e isolado da tomada de decisões estratégicas.

Há, também, o problema do timing. Mesmo quando há tempo suficiente na formulação de estratégias para tratar de questões difíceis, o timing do processo pode criar problemas. Na maioria das empresas, o planejamento estratégico é um processo em lote no qual os gestores analisam informações sobre o mercado e a concorrência, identificam ameaças e oportunidades e, então, definem um plano plurianual. Mas, no mundo real, é preciso tomar decisões estratégicas de modo contínuo, em geral devido à necessidade imediata de ação (ou reação). Quando uma nova rival chega ao mercado, por exemplo, ou uma adversária lança uma nova tecnologia, é preciso agir com rapidez e determinação para resguardar o desempenho da empresa. Mas pouquíssimas empresas (menos de 10%, segundo a pesquisa) têm algum processo rigoroso ou disciplinado para reagir a mudanças no ambiente externo. Em vez disso, os gestores utilizam processos ad hoc para corrigir a rota ou tomar medidas oportunistas. Mais uma vez, o executivo ignora o planejamento estratégico e se arrisca a tomar decisões ruins, carentes de uma cuidadosa ponderação.

Decisões sobre fusões e aquisições são um exemplo notório do problema do timing. Oportunidades de aquisição tendem a surgir espontaneamente, fruto de mudanças na gestão da empresa-alvo, de atos de uma rival ou outro evento imprevisível. Diante da oportunidade promissora e com tempo limitado para agir, os executivos não podem esperar até que a oportunidade seja analisada no próximo ciclo de planejamento anual. Logo, avaliam o acordo e tomam uma decisão rápida. Mas, como em geral esse processo de análise é falho, questões menos tangíveis ligadas a clientes e a funcionários, tão críticas para a efetiva integração da empresa adquirida, acabam menosprezadas. Não é coincidência que a incapacidade de planejar a integração seja freqüentemente citada como a principal causa do fracasso de fusões.

O efeito divisão de negócios. O foco organizacional do processo de planejamento agrava os efeitos - ou, talvez melhor, defeitos - da submissão ao calendário. Dois terços dos executivos por nós ouvidos disseram que o planejamento estratégico em sua empresa é feito isoladamente - ou seja, em cada divisão ou grupo de divisões. Já 70% dos executivos de maior graduação que responderam à pesquisa disseram tomar decisões problema por problema. Devemos entrar na China? Devemos terceirizar a produção? Devemos adquirir nosso distribuidor? Dado esse descompasso entre o modo como o planejamento é organizado e o modo como as grandes decisões são tomadas, não surpreende, de novo, que dirigentes empre- sariais busquem orientação e inspiração em outro lugar. Com efeito, apenas 11% dos executivos que ouvimos tinham a forte convicção de que o planejamento valia o esforço.

O foco organizacional do planejamento estratégico tradicional também gera o distanciamento - antagonismo, até - entre executivos da matriz e gestores das divisões de negócios. Vejamos, por exemplo, o modo como a maioria das empresas conduz avaliações de estratégia: como reuniões formais entre altos gerentes e as chefias de cada divisão. Embora a intenção destas avaliações seja gerar um diálogo fundado em fatos, muitas vezes não passam de turismo de negócios. O comitê executivo se desloca por um dia, confere o que está à vista, fala com o pessoal local e vai embora. Já a divisão de negócios se empenha nos preparativos para a visita real e faz de tudo para que transcorra tranqüilamente, sem atropelos. A divisão espera se safar com um par de questões sem resposta e um plano aprovado. Para tanto, a cúpula local controla o fluxo de informações que chega à diretoria na matriz, que só ouve aquilo que mostra a divisão à luz mais favorável possível. Oportunidades são realçadas, ameaças são atenuadas ou omitidas.

Ainda que não haja subterfúgios, é difícil para a matriz embarcar num diálogo e num debate construtivos, devido a uma assimetria de informação, pois não conta com a informação necessária para dar uma orientação útil à divisão de negócios. Logo, quando a divisão apresenta um plano estratégico bom demais para ser verdade, a cúpula tem apenas duas alternativas reais: rejeitá-lo, medida praticamente inconcebível na maioria das grandes empresas, ou acatá-lo e impor metas dificílimas para ao menos sair dali com a promessa de que a divisão vai melhorar o desempenho. Em ambos os casos, a avaliação pouco ajuda na tomada de decisões sobre problemas. Não espanta que apenas 13% dos executivos que ouvimos sejam da opinião de que gerentes de cúpula tinham participação efetiva em todos os aspectos do desenvolvimento de estratégia na empresa - da definição de metas à discussão de alternativas, da aprovação de estratégias à alocação de recursos.

Planejamento estratégico voltado à decisão
Se não promover a tomada de decisão, o planejamento estratégico não terá impacto. E não será um motor da decisão enquanto seguir focado em divisões  isoladas e circunscrito ao calendário. Nos últimos anos, vimos muitas empresas de altíssimo desempenho abandonarem a abordagem tradicional e fecharem o foco na tomada de decisões através da identificação contínua e da resolução sistemática de questões estratégicas (o quadro "Planejamento contínuo, voltado à decisão" traz um exemplo detalhado da abordagem voltada a questões específicas). Embora cada empresa dessas tenha encontrado a própria solução, todas fizeram essencialmente as mesmas mudanças fundamentais nos processos de planejamento e desenvolvimento de estratégias a fim de tomar um número maior de decisões, com mais qualidade e maior rapidez.

Separar - mas integrar - a tomada de decisão e o planejamento. Um primeiro passo, de suma importância, é excluir as decisões do processo tradicional de planejamento e criar um processo paralelo distinto para desenvolver a estratégia - processo que ajude executivos a identificar decisões que precisam tomar para gerar mais valor ao acionista ao longo do tempo. O resultado desse novo processo não é um plano, mas um conjunto de decisões concretas que a gerência pode codificar em futuros planos de negócios através do processo de planejamento existente, que é mantido. Identificar e tomar decisões é diferente de criar, monitorar e atualizar um plano estratégico, e os dois grupos de tarefas exigem processos bem distintos, mas integrados.

A Boeing Commercial Airplanes (BCA) é um exemplo. A divisão, a maior da Boeing, teve por muitos anos um plano de negócios de longo alcance (PNLA). Prolongado, o ciclo de produção de aviões comerciais exige que o presidente da divisão, Alan Mulally, e sua equipe diretora adotem uma perspectiva de longo prazo do negócio. Daí o PNLA da divisão trazer uma projeção financeira para dez anos, incluindo receitas, pedidos, margens operacionais e investimento de capital previstos. Os líderes da BCA analisam toda semana o PNLA para comparar o desempenho da divisão ao projetado e manter a organização focada na execução.

Essa avaliação semanal era inestimável para o monitoramento do desempenho na BCA. Mas não era muito eficaz em trazer à tona novos problemas ou promover a tomada de decisões estratégicas. Até que, em 2001, a diretoria da divisão adotou um processo de integração de estratégia voltado a expor e a enfrentar as questões mais prementes da divisão (determinar a melhor estratégia de abordagem do mercado, promover a evolução da estratégia de produtos da BCA, fomentar o crescimento em serviços). A equipe destacada para o processo faz reuniões de integração de estratégias toda segunda-feira para conferir o progresso da BCA na resolução das questões de longo prazo. Uma vez definida e aprovada uma rota de ação pela equipe gestora da BCA, o PNLA era atualizado na reunião semanal seguinte para refletir a mudança projetada no desempenho financeiro.

O tempo investido no novo processo de tomada de decisão é mais que compensado pelo tempo poupado no processo do PNLA, agora voltado exclusivamente à execução da estratégia. A empresa ganha dos dois lados - sua tomada de decisões é disciplinada e sua execução, superior. O valor do PNLA como ferramenta de execução foi mantido mesmo com o aumento da qualidade e da quantidade de decisões importantes tomadas na BCA. Para os gerentes, o novo processo merece parte do crédito pela drástica virada no desempenho da Boeing desde 2001.

Concentrar-se em certas questões cruciais. Empresas de alto desempenho costumam centrar o debate sobre a estratégia num número limitado de questões ou temas importantes, muitos deles abrangendo várias divisões de negócios. Abandonar o modelo de planejamento isolado, divisão por divisão, revelou-se muito útil para organizações grandes e complexas, nas quais a discussão da estratégia facilmente empaca à medida que cada gerente de divisão tenta cobrir todo aspecto da estratégia local. Gestores de divisões de negócios devem, sim, permanecer envolvidos no planejamento estratégico geral - quando isso atinge sua divisão. Mas o foco em temas específicos, e não em cada divisão, garante um melhor alinhamento do desenvolvimento da estratégia com a tomada de decisão e o investimento.

Peguemos a Microsoft. Maior fabricante de software do mundo, é uma organização altamente matricial. Não há como executar efetivamente uma estratégia na empresa sem uma cuidadosa coordenação entre diversos departamentos e sem abranger duas ou mais das sete divisões de negócios, chamadas pelos executivos da casa de P&Ls (a saber, Client; Server and Tools; Information Worker; MSN; Microsoft Business Solutions; Mobile and Embedded Devices; e Home and Entertainment). Em fins de 2004, diante de uma suposta escassez de boas idéias de investimento, o presidente da Microsoft, Steve Ballmer, pediu ao vice-presidente de estratégia, planejamento e análise, Robert Uhlaner, que criasse um novo processo de planejamento estratégico para a empresa. Uhlaner montou um Processo de Planejamento de Crescimento e Desempenho que parte do consenso da equipe executiva de Ballmer em torno de uma série de temas estratégicos - questões de peso como crescimento de mercado de micros, mercado de entretenimento e segurança - que transcendem fronteiras de cada divisão. Além de enquadrar o diálogo para a avaliação anual de estratégia da empresa, esses temas norteiam a busca de alternativas de investimento pelas divisões para fomentar o crescimento. O diálogo entre dirigentes das P&Ls e a equipe de Ballmer atém-se àquilo que a empresa pode fazer para contemplar cada tema estratégico, e não estratégias específicas das divisões. Os primeiros resultados desse novo processo são promissores. "É preciso ter cuidado com aquilo que se deseja", diz Uhlaner. "Nosso novo processo trouxe à tona inúmeras oportunidades novas de crescimento. Nossa preocupação já não é a escassez de idéias para investimento, mas como financiar melhor todas elas."

Assim como a Microsoft, a Diageo North America - divisão da multinacional de cerveja, vinho e destilados - mudou há pouco o modo como conduz o planejamento estratégico para alocar recursos por toda sua diversificada carteira de negócios. Até ali, o planejamento na Diageo se concentrara em cada marca isoladamente. Um gerente podia defender investimentos adicionais independentemente do porte da marca ou de seu papel estratégico na carteira. Com isso, a alocação de recursos era entravada por infindáveis negociações entre marcas e a cúpula na matriz. Essa queda-de-braço política tornava muito difícil para a diretoria da Diageo estabelecer uma abordagem coesa ao crescimento, pois a falta de transparência impedia que discernissem, dentre os muitos pedidos de fundos adicionais, que marcas realmente mereciam mais recursos.

Em 2001, teve início a reforma da abordagem da Diageo à formulação de estratégias. Uma mudança crucial foi concentrar o planejamento em fatores que dariam mais impulso ao crescimento do mercado - aumento da população hispânica dos Estados Unidos, por exemplo. Ao projetar o impacto desses fatores na carteira de marcas, a Diageo conseguiu conciliar melhor os recursos com as marcas de maior potencial de crescimento - e definir estratégias e investimentos que cada gerente de marca deve desenvolver, diz Jim Moseley, vice-presidente sênior de pesquisa e planejamento de consumo da Diageo North America. A divisão agora define que marcas deverão crescer e atribui recursos específicos para investimento nessas divisões. Essa abordagem focada permitiu à empresa abreviar o processo de planejamento de marcas e reduzir o tempo gasto em negociações entre marcas e gerentes de divisão. Além disso, deu à alta cúpula mais confiança na capacidade de cada marca de contribuir para o crescimento da Diageo.

Tornar contínuo o desenvolvimento de estratégias. Um bom planejador estratégico efetua avaliações da estratégia durante todo o ano, e não apenas num intervalo de dois ou três meses. Com isso, altos executivos podem se concentrar num problema de cada vez até chegar a uma decisão ou conjunto de decisões. Além disso, é possível adicionar problemas à pauta à medida que as condições competitivas e de mercado mudem, eliminando a necessidade de processos improvisados. A cúpula executiva pode, assim, apostar num único processo de planejamento estratégico - ou, talvez melhor, num único modelo de tomada de decisão estratégica - para fomentar a tomada de decisão por toda a empresa.

A Textron, empresa de US$ 10 bilhões e atuante em vários setores, adotou um processo novo de desenvolvimento estratégico. Contínuo, é centrado numa "pauta de decisões" priorizada que contempla os temas e oportunidades mais importantes da empresa. Até 2004, a Textron tinha um processo de planejamento estratégico bastante tradicional. Todo ano, no segundo trimestre, suas divisões operacionais - negócios tão distintos como a Bell Helicopter, os carros de golfe E-Z-Go e o maquinário de manutenção de gramados Jacobsen - montavam um plano estratégico qüinqüenal seguindo um modelo padrão. Em seguida, cada chefe de divisão revisava seus planos estratégicos ao comitê gestor da Textron (os cinco principais executivos da empresa) em reuniões de dia inteiro em cada divisão. Concluída a avaliação da estratégia, as divisões faziam o possível para incorporar os resultados a seus planos operacionais e orçamentos anuais de capital.

Em junho de 2004, insatisfeito com a qualidade e o ritmo do processo decisório resultante das avaliações de estratégia, o presidente, Lewis Campbell, pediu ao vice-presidente de estratégia e desenvolvimento de negócios, Stuart Grief, que repensasse todo o processo de planejamento estratégico. Depois de analisar atentamente as práticas da Textron e consultar seus 30 principais executivos, Grief e a equipe montaram um novo Processo de Estratégia Textron.

Houve duas mudanças importantes. Primeiro, em vez de concentrar as avaliações de estratégia das divisões operacionais no segundo trimestre de cada ano, a empresa agora distribui o debate estratégico pelo ano todo, analisando duas ou três divisões por trimestre. Segundo, em vez de centrar as discussões do comitê gestor nos planos de cada divisão, a Textron agora faz revisões contínuas para poder contemplar cada problema estratégico na pauta de decisões da empresa. As duas mudanças garantiram ao comitê gestor da Textron um envolvimento muito mais efetivo na formulação de estratégias das divisões. Com as mudanças, surgiu também um fórum no qual a alta gerência pode expor e enfrentar questões que atingem mais de uma divisão, com o input de gerentes relevantes de cada uma delas. O processo aumentou consideravelmente o número de decisões estratégicas tomadas a cada ano. A Textron, que era uma espécie de lanterninha entre as pares multissetoriais, viu seu desempenho ser alçado ao quartil superior nos últimos 18 meses.

Na Cardinal Health, uma das maiores empresas de serviços e produtos de saúde do mundo, John Cullivan, o diretor de estratégia, relata benefícios semelhantes da adoção de um modelo de planejamento contínuo. "É difícil estabelecer um processo decisório contínuo, pois isso exige a realocação do tempo de gerentes nos escalões mais altos da empresa", diz. "Mas o processo permitiu uma concentração maior no desempenho a curto prazo de nossos negócios verticais e um progresso mais acelerado em prioridades de prazo mais longo, algumas delas oportunidades horizontais que abrangem várias divisões de negócios e são, portanto, de difícil gestão."

Para viabilizar a tomada contínua de decisões estratégicas, a Cardinal fez uma série de mudanças importantes no processo tradicional de planejamento. Na matriz, a empresa adotou uma agenda semestral dinâmica para as discussões do comitê executivo, prática que permite que todos dentro da Cardinal saibam com que questões a diretoria está lidando e em que momento chegará a uma decisão. Divisões de negócios e departamentos também usam agendas decisórias semelhantes, garantindo a aplicação de padrões comuns a toda decisão importante na empresa. Para dar apoio à tomada contínua de decisões na Cardinal, a empresa distribuiu organização afora "faixas pretas" especializados nos novos processos e ferramentas analíticas. Com isso, cada divisão ou departamento da empresa conta com os recursos necessários para lidar com prioridades estratégicas surgidas ao longo do tempo.

Estruturar avaliações de estratégia para produzir decisões reais. O obstáculo mais comum à tomada de decisão em grandes empresas é a divergência de executivos acerca de decisões passadas, alternativas presentes e até fatos apresentados para corroborar planos estratégicos. Uma empresa sábia estrutura as sessões de avaliação de estratégias para superar esses entraves.

Na Textron, por exemplo, avaliações de questões estratégicas são organizadas em torno de "fatos, alternativas e escolhas". Cada problema é abordado em duas reuniões de meio dia com o comitê gestor da empresa, o que permite a resolução de 8 a 10 problemas ao longo do ano. Na primeira reunião, o comitê gestor discute fatos relevantes, como dados sobre a rentabilidade de mercados cruciais, tacadas da concorrência, padrão de compra de clientes e por aí vai. A idéia é definir de modo consensual o problema e uma série limitada de alternativas estratégicas viáveis. O objetivo da reunião não é estabelecer um curso de ação específico, mas garantir que o grupo receba a melhor informação possível e um amplo leque de alternativas a considerar. O foco da segunda reunião é a avaliação dessas alternativas de um ponto de vista estratégico e financeiro e a escolha da melhor rota de ação. Ao separar a discussão sobre fatos e alternativas do debate em torno das escolhas, o comitê gestor da Textron evita muitos dos gargalos que afligem o processo decisório estratégico na maioria das empresas e chega a um número muito maior de decisões.

Assim como a Textron, a Cadbury Schweppes mudou a estrutura do debate sobre estratégias para que os gerentes de cúpula se concentrassem mais no processo decisório. Em 2002, depois de adquirir e assimilar a fabricante de chicletes Adams - tacada que ampliou consideravelmente o alcance geográfico e de produto da Cadbury - , a empresa percebeu que era preciso repensar o modo como conduzia a discussão sobre estratégia entre a matriz e as divisões de negócios. Fez duas mudanças importantes. Primeiro, o debate sobre a estratégia foi reformulado para poder incorporar uma série de fatos e medidas-padrão sobre consumidores, clientes e concorrentes. Essa informação ajudou a expor a gerentes da cúpula opções comerciais críticas - opções até ali confinadas às divisões de negócios. Segundo, o tempo de altos executivos foi realocado para que pudessem dar mais atenção a mercados cruciais para a consecução da meta da Cadbury para os dez anos seguintes e para a tomada de decisões importantes.

A cúpula da Cadbury hoje passa uma semana inteira por ano em cada um dos países mais vitais para o desempenho da empresa, de modo que subsídios para decisões importantes possam ser colhidos da observação direta, não só da análise indireta. O debate sobre estratégias agora é fundado numa compreensão muito maior do mercado. As avaliações estratégicas da Cadbury já não consistem na mera análise e aprovação de planos estratégicos, e geram um volume muito maior de decisões importantes.

Feito corretamente, o planejamento estratégico pode ter enorme impacto sobre o desempenho e o valor da empresa no longo prazo. Ao criar um processo de planejamento que permita aos gestores descobrir problemas estraté-gicos ocultos e tomar um volume maior de decisões, a empresa abre as portas para mais oportunidades de crescimento e rentabilidade no longo prazo. É provável que, ao adotar o planejamento centrado em decisões, a empresa constate uma melhora na quantidade e na qualidade das decisões. E, não por coincidência, a empresa descobre que melhorou a qualidade do diálogo entre altos executivos da matriz e gerentes de divisões. Executivos da matriz ganham uma compreensão melhor dos desafios enfrentados pela empresa, enquanto os chefes de divisão se beneficiam da experiência e das idéias dos líderes da empresa. É como diz Mark Reckitt, diretor de estratégia da Cadbury Schweppes: "O planejamento estratégico contínuo, centrado em decisões, ajudou nossa cúpula a otimizar sua agenda e a trabalhar com as divisões de negócios e gestores setoriais para a tomada de decisões comerciais e de estratégia de negócios muito melhores."