10 de nov. de 2008

ISTO TAMBÉM PASSARÁ

ABRAHAM SHAPIRO

Uma das sensações mais amargas de quem enfrenta uma dificuldade é a de que ela nunca irá passar. Muitos sucumbem por acreditar nisto.

O fato inegável, porém, é que, de um momento para outro, todo o quadro pode mudar. E esta mudança ser-lhe-á favorável.

Ninguém tem o poder de prever o tempo de duração de uma crise. Mas é saudável saber que do mesmo modo inesperado como ela se instala, assim também ela se vai.

Nossa revolta muitas vezes surge pelo fato de que trabalhamos, fazemos planos, lutamos muito e parece que tudo isso de nada vale, pois, as conseqüências parecem ter sido uma grande confusão, bem distante do que desejávamos. Assim, nos deparamos com aquela célebre questão: “o bom sofre e o malvado prospera”. Como encaixar as peças deste quebra-cabeça?

A inquietante antítese do sofrimento dos bons e da prosperidade dos maus origina-se de uma falta de perspectiva. De alguma maneira todos nós achamos que o mundo começa quando nascemos e acaba quando morremos. Tudo o que passa antes disso chamamos de “antigamente”. Por esta lógica, se eu não posso entender o que está acontecendo neste exato momento, então é seguro que não há qualquer sentido.

No entanto, nós estamos neste mundo por um espaço de tempo relativamente muito curto. Setenta, oitenta, noventa anos! Ainda que sejamos tão longevos, não estamos assistindo ao “Grande Filme” onde todos os fatos fazem parte de uma única história. Não conhecemos todos os detalhes que passaram antes de estarmos aqui e certamente não saberemos o que passará quando não estivermos mais aqui.

“Por quê tal evento ocorreu?” é uma pergunta cuja resposta podemos não ter imediatamente. Corremos o risco até de não tê-la ao longo de todo o tempo de nossa vida.

Talvez este seja o caminho pelo qual grandes homens atingem a sabedoria. Eles têm maior perspectiva do tempo. Eles vêem melhor o modo como eventos aparentemente não relacionados se conectam na obscuridade. Observe, por exemplo, que quando as coisas parecem mais desalentadoras, então é que elas se invertem. A noite está na mais absoluta escuridão exatamente no momento anterior ao amanhecer. Assim, a escuridão não é algo negativo, mas um estágio necessário para que a luz se faça presente. Só mesmo por causa de nossa limitada percepção é que achamos a escuridão um fim em si mesma e, por isso, negativa.

Uma semente quando posta na terra está em um lugar obscuro, frio e sujo. Então, começa a enrugar-se e a apodrecer. Alguém que a observa de fora chegará a pensar que ela morreu. Aí, no instante em que chegou a seu pior estado aparente, um milagre ocorre. Ela começa a germinar e dá origem a uma nova vida.

DA ESCURIDÃO SURGE A LUZ

Eu chorei quando li a seguinte história.

Durante a Segunda Guerra Mundial, havia na Inglaterra muitos cidadãos alemães que lá viviam. Muitos deles eram Judeus. O governo inglês temia que entre eles houvesse alguns que fossem espiões. Decidiu mandá-los para viver temporariamente em ilhas próximas. Desta forma não teriam acesso a qualquer informação secreta.

Depois de um tempo, os ingleses viram que o custo de manutenção destas pessoas em uma ilha era muito elevado e por este motivo pediram ao governo da Austrália que os recebesse em seu território. Isto gerava, no entanto, um novo problema: quem formaria a tripulação de um navio que os transportasse, já que navegar por esta zona implicava um risco de ataque muito grande?

Os únicos que aceitaram a empreitada foi um grupo de presos condenados a quem foi concedida a liberdade como pagamento por uma missão de tão grande risco. O governo britânico aceitou que assim fosse e em poucos dias o barco com aqueles cidadãos judeus-alemães estava navegando rumo à Austrália.

Em circunstâncias como esta os ingleses deviam mandar uma comitiva militar que os escoltasse até o destino. Isto não foi feito. O barco teve de navegar sozinho em meio a um incalculável perigo.

Ao sair de águas territoriais inglesas, os presidiários que formavam a tripulação começaram a roubar o dinheiro e a jóias dos Judeus enquanto exigiam que todas as suas prendas e livros fossem arrojados ao mar.

Além da dor da perda de suas posses, a indignação daqueles passageiros era muito grande. Roubar deles todo o dinheiro era lógico, porém, que benefício tinham os ladrões em atirar as roupas e livros ao mar? A muitas daquelas pessoas este episódio acabou desmoralizando de forma traumática. “Por quê Deus nos permitiu isso? Acaso não era suficiente termos sido extraditados? Por quê não nos deixaram nossas prendas e os livros?” – se perguntavam. Havia outros que tratavam de olhar adiante.

Ninguém podia responder a estas perguntas, porém muitos sabiam que se D-us assim decidiu, seguramente era para o bem.

Finalmente, estes Judeus chegaram à Austrália e começaram a buscar sua sobrevivência e trabalho para refazer suas vidas. O tempo passou e conseguiram adaptar-se bem à nova sociedade. Muitos cresceram economicamente. No entanto, o dilema do navio continuava em seus corações sem que pudessem entender o porquê.

Quarenta e um anos depois deste incidente tão triste, foi lançado um livro chamado: “Memórias de um general nazista”. Neste livro havia relatos de todas as experiências militares do autor durante a Segunda Guerra.

No quarto capítulo ele conta que em uma de suas operações militares, estava em um submarino vigiando as águas do inimigo inglês quando detectou um barco com bandeira inglesa. De imediato dispararam dois torpedos. Nenhum atingiu o barco. De repente, algo estranho demais: viram livros e roupas no mar.

Soldados da marinha conseguiram alcançar alguns dos livros e os levaram ao interior do submarino para averiguações. Ao abri-los, encontraram textos de novelas em idioma alemão. Diante daquela constatação, suspeitaram que se tratava de ingleses conduzindo reféns alemães.

Ao informar seus superiores, recebeu a ordem de acompanhar o barco até que saísse da zona de perigo e, desta maneira, salvar os cidadãos alemães que viajavam nele.

Estava, enfim, explicado o propósito da humilhação.


NA ZONA DE TURBULÊNCIA

Mesmo nas situações em que estamos impedidos de agir para melhorar, impossibilitados de ver mudança de rumo no futuro, precisamos saber e acreditar que a salvação poderá ocorrer no instante seguinte.

Quando um avião penetra uma zona de nuvens densas, tem-se a impressão de que a turbulência nunca passará. De repente, quando menos se espera, o céu abre e a esperança retorna.

Um homem perdeu seu emprego. Chega triste em sua casa. A depressão o ameaça. Para refrescar seus pensamentos resolve dedilhar algumas notas musicais no teclado eletrônico de sua filha. Depois de anos, ele recorda lições de música da juventude.

Dias se passam e ele se encoraja a tocar uma canção na festa de aniversário de um amigo. Surpresa geral. Os aplausos o convencem de que sua interpretação não foi de se jogar fora. Ele começa a tocar em festas e casamentos e cobra por isso. Sente-se motivado em ver que as pessoas estão dispostas a pagar o quanto ele pede. Em pouco tempo sua agenda já é concorrida entre muitos interessados.

O novo negócio torna-se sua fonte de sustento. Ele consegue o ganho que nunca obteve em sua profissão e agora sente um prazer que antes não tinha. Ele nunca apostou em seu talento musical.

A crise mostrou um caminho novo. E isso sempre é possível. A questão é abrir os olhos para ver.

“Aprendi muito de meus mestres, e mais de meus colegas” – disse, um grande sábio e professor – “mas de meus alunos, o quanto aprendi superou tudo o mais”.

Dos mestres é normal aprender. Também dos amigos. Esta é a regra. Mas os alunos propõem perguntas sagazes; disparam desafios que motivam e estimulam o professor. Isto é que não o deixa manter seus conhecimentos em desuso como se fossem livros esquecidos em uma prateleira. Deste desconforto surgem novas facetas de sabedoria ainda não pensadas, novos níveis de aprendizagem não explorados antes. A qualidade das aulas melhora. Todos ganham e se orgulham do professor que têm. Mas quem, de fato, foi responsável por este processo altamente dinâmico? A crise.

Portanto, as crises são oportunidades reais que estão à nossa disposição.

Quando há a necessidade de se realizar algo e uma barreira se opõe ao curso calculado e planejado, acionamos forças imensas para sobrepujá-la. Quando, então, a superamos, o sentimento que desponta é: “Veja só! Eu nem imaginava que podia fazer isso! Lutei muito, e por isso consegui!”

Pois é! Para que tenhamos finais vitoriosos como este é que existem as crises. E por causa da minha fé, sou obrigado a completar com: "todas elas".
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Abraham Shapiro é consultor e coach. Suas principais atuações são junto de líderes empresariais e times de vendas. Contato: shapiro@shapiro.com.br